Ananindeua: secretários de Daniel Santos estão na mira do MP

Dois secretários municipais, o ex-presidente da Comissão Permanente de Licitação (CPL) e um ex-presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Pará (Crea-PA) são suspeitos de envolvimento em uma suposta quadrilha, que teria desviado mais de R$ 109 milhões das secretarias de Saúde e de Saneamento da Prefeitura de Ananindeua. A suposta quadrilha foi o alvo da operação Aqueronte, na última sexta-feira, pelo Gaeco, o grupo de combate a organizações criminosas do Ministério Público do Pará (MPPA).Ainda na sexta-feira, o secretário de Saneamento, Paulo Roberto Cavalleiro de Macedo, e o ex-presidente da CPL, Manoel Palheta Fernandes, foram afastados de funções públicas, por decisão judicial. Manoel, um dos principais suspeitos, figura na Folha de Pagamentos da Prefeitura como “Assessor Estratégico” do Gabinete do prefeito Daniel Barbosa Santos, mas estaria lotado na Secretaria Municipal de Licitação, como “Agente de Contratação”. Outra suspeita, a secretária de Saúde Dayane Silva Lima, permanece no cargo, já que não houve pedido do MPPA à Justiça, para o seu afastamento. As construtoras envolvidas no suposto esquema pertencem ao ex-presidente do Crea-PA, Danillo da Silva Linhares.Quer saber mais notícias do Pará? Acesse nosso canal no WhatsappApreensõesNa sexta-feira, durante a operação Aqueronte, integrantes do Gaeco e do GSI, o grupo de Inteligência do MPPA, cumpriram mandados de busca e apreensão nas residências do empresário, dos secretários municipais, do ex-presidente da CPL e de mais dois suspeitos: Antonio Gilberto Alves de Lima Junior e Fernando Frota de Lima Neto. O primeiro é ex-sócio do ex-presidente da CPL; o segundo, enteado dele. Gaeco e GSI também estiveram nas sedes das empresas Edifikka Construra Ltda e DSL Construtora e Incorporadora, pertencentes ao empresário Danillo da Silva Linhares, e no Setor de Licitações e Execuções de Contratos da Prefeitura de Ananindeua, na Cidade Nova II. Foram apreendidos celulares, computadores e documentos.Ainda na sexta-feira, o Diário Oficial de Ananindeua publicou o afastamento do secretário da Sesan e do ex-presidente da CPL, “até ulterior deliberação e sem prejuízo da remuneração”. Mas o prefeito Daniel Barbosa Santos não mencionou o motivo do afastamento.

IndíciosO DIÁRIO teve acesso a documentos do processo 0815821-68.2024.8.14.0401, ajuizado pelo MPPA, no início do mês passado, na Vara de Combate ao Crime Organizado de Belém, para apurar o caso. Na capa do processo, no site do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), todos figuram como “acusados”, e não apenas como investigados. Segundo a documentação, o MPPA encontrou indícios de fraudes em 6 licitações milionárias das secretarias de Saúde (Sesau) e de Saneamento (Sesan), realizadas pela então CPL, hoje Secretaria Municipal de Licitação. As fraudes teriam beneficiado a Edifikka e a DSL. Em metade das licitações supostamente fraudadas, o ex-sócio e o enteado do então presidente da CPL, Manoel Palheta Fernandes, teriam figurado até como representantes legais das duas construtoras. O MPPA também descobriu que o secretário municipal de Saneamento, Paulo Roberto Cavalleiro de Macedo, agora afastado do cargo, residia no mesmo condomínio de luxo do empresário Danillo da Silva Linhares, na época em que a Edifikka foi contratada pela Sesan.Licitações são disputas de empresas, em igualdade de condições, para a execução de obras e serviços públicos. O objetivo do Poder Público é baratear os preços e conseguir a melhor qualidade possível, para essas obras e serviços. Mas, segundo o MPPA, há indícios de fraudes por uma “organização criminosa”, nas 6 licitações que teriam resultado no desvio de R$ 109 milhões, na Prefitura de Ananindeua.Os investigados, diz o MPPA, “estruturaram e ordenaram” a atuação de duas empresas, a Edifikka e a DSL, “dividindo tarefas com o objetivo de obter diretamente vantagem financeira na casa de milhões de reais”. Para tanto, frustravam justamente o caráter competitivo das licitações, crime previsto no artigo 337-F do Código Penal (CP), com pena de até 8 anos de cadeia. Isso teria sido feito através de exigências ilegais de uma série de documentos, o que prejudicava as demais concorrentes, enquanto beneficiava as duas empresas. É o chamado “direcionamento” da vitória de uma licitação.Entre 2022 e 2023, a Edifikka venceu quatro Concorrências Públicas da Prefeitura de Ananindeua, que somaram R$ 88,3 milhões. Todas para obras e serviços da Sesan. O que, segundo o MPPA, “aponta para a probabilidade de que esses certames tenham sido montados ou preparados” para favorecê-la. Em todos os editais licitatórios (o documento que rege uma licitação), foram identificados “itens restritivos” à competição, diz o MPPA. Ao mesmo tempo, não foram encontrados documentos comprovando as qualificações técnico-operacionais e técnico-profissionais da Edifikka, para a execução dos contratos que obteve. A maior das licitações que ela venceu foi a Concorrência Pública 3/2023-016-PMA/SESAN, para drenagem e pavimentação asfáltica. O contrato decorrente, assinado em 28 de agosto do ano passado e com vigência até o próximo dia 22, foi suspenso, na última sexta-feira, por ordem judicial. O valor inicial dele era de R$ 66,3 milhões, mas acabou atingindo mais de R$ 79 milhões, devido a um aditivo de preço. Apesar do alto valor em disputa, apenas 3 empresas se cadastraram para a licitação e só a Edifikka compareceu.

Ministério Público do Estado aponta irregularidade em resultados de licitaçõesO MPPA também detectou uma irregularidade surpreendente, em licitações vencidas pela Edifikka e pela DSL, a outra construtora suspeita de integrar a suposta quadrilha. Na Tomada de Preços 2/2022-049, da Sesan, para a reforma do Mercado do 40 Horas, o representante da Edifikka foi o empresário Antônio Gilberto Alves de Lima Júnior. Que, segundo as investigações, foi sócio da empresa J. Rocha Indústria e Comércio de Alimentos Ltda, da qual também foi sócio o então presidente da CPL, Manoel Palheta Fernandes.Idem para a Concorrência Pública 3/2022-030, também da Sesan, para drenagem, terraplenagem e recapeamento asfáltico, em vários bairros de Ananindeua, cujo valor contratual alcançou R$ 21 milhões, por força de um aditivo. Quem venceu foi a DSL, e o representante dela, na licitação, também foi Antônio Gilberto Alves de Lima Júnior.Irregularidade até mais grave ocorreu na Concorrência Pública SRP 3/2021-022, no valor de R$ 5,8 milhões, para a manutenção predial de todas as unidades da Secretaria de Saúde (Sesau): quem assinou o contrato, como representante da DSL, foi Fernando Frota de Lima Neto, enteado do então presidente da CPL, Manoel Palheta Fernandes, diz o MPPA.O MPPA também encontrou aumentos dos capitais sociais da Edifikka e da DSL, dias antes da divulgação de editais licitatórios. O que seria “indício de operação contábil para atender os critérios de qualificação econômico-financeira” desses editais. Ambas, também, estariam usufruindo de vantagens indevidas, inclusive em licitações, por permanecerem cadastradas como EPPs (Empresas de Pequeno Porte), embora as suas receitas operacionais superem, em muito, os R$ 4,8 milhões anuais, que é o limite para o enquadramento como EPP. O MPPA aponta, ainda, indícios de omissão de faturamento pela Edifikka, devido ao aumento irrisório de seus ativos, entre 2021 e 2022, apesar dos contratos milionários que assinou com a Prefeitura de Ananindeua. O pedido de busca e apreensão que atingiu também as duas empresas, na última sexta-feira, está assinado por quatro promotores do Gaeco: Muller Marques Siqueira, Bruno Saravalli Rodrigues, Carlos Alberto Fonseca Lopes e Thiado Ribeiro Sanandres.PARA ENTENDERSituação das empresas EdifikkaA Edifikka foi aberta por Danillo da Silva Linhares, em fevereiro de 2021, com um capital de apenas R$ 100 mil. Um ano depois, em março de 2022, o capital aumentou para R$ 500 mil. E, em maio de 2023, para R$ 1,2 milhão. A integralização de capital foi realizada com o registro de uma retroescavadeira e de 2 veículos, entre eles uma BMW.No endereço atual dela, na avenida Três Corações, no bairro da Cidade Nova, o MPPA encontrou apenas uma funcionária, que disse estar encarregada somente de receber as correspondências da empresa, e de atender o público em relação ao residencial Sky Park. Em nenhum momento, diz o MPPA, ela mencionou o empresário Danillo Linhares como o responsável pelo escritório.Já o endereço anterior da Edifikka, na Rua da Pedreirinha, no bairro da Guanabara, está cadastrado como sede, também, da DSL Construtora e da Gênesis Empreendimentos Ltda, ambas também pertencentes ao empresário. Mas, no local, o MPPA encontrou apenas um condomínio ainda em construção, o Sky Park, e uma corretora de imóveis disse que as três empresas não dispõem de sede fixa.Quanto ao primeiro endereço da empresa, não foi encontrado o número 111 da Travessa SN-15, na Cidade Nova 3, e a vizinhança disse que nunca existiu uma construtora por lá. A numeração mais próxima localizada foi do estacionamento do Hospital Modelo.O MPPA descobriu outros indicativos preocupantes da capacidade operacional da Edifikka, para os contratos com a Prefeitura de Ananindeua. A empresa possui apenas dois veículos cadastrados: um caminhão VW/13.180, ano 2002, e uma Land Rover, ano 2022/2023, veículo que nem é usado em obras de construção. Além disso, desde setembro de 2021, possui apenas 19 funcionários registrados. DSLJá a DSL, a outra empresa suspeita de integrar o esquema de fraudes, foi aberta pelo empresário em setembro de 2012, com o nome de Build Engenharia. O capital social era de apenas R$ 100 mil. Dez anos depois, em março de 2022, o capital aumentou para R$ 1 milhão, totalmente integralizado.O primeiro endereço registrado por ela foi no residencial de luxo, em Ananindeua, onde o empresário Danillo Linhares mora até hoje. Em 2018, teria se mudado para a avenida Doutor Freitas, nº 55, casa D, no bairro da Sacramenta, em Belém. Mas o Instituto Ambiente, que funciona naquele endereço desde 2012, disse ao MPPA que ali nunca houve nenhuma outra entidade além dele.Já em 2020, a DSL passou a registrar como endereço a rua da Pedreirinha, 126, no bairro Guanabara, onde o MPPA só encontrou um terreno com um condomínio em construção. Lá, segundo o MPPA, a empresa também já não possui cadastro de energia elétrica.O cadastro de energia que possuiu foi de agosto de 2022 a janeiro de 2023, mas com “média de consumo muito baixa, para os padrões de uma organização com complexo segmento de atuação”, diz o processo que os promotores ajuizaram. Além disso, ela possui apenas um veículo registrado: uma caminhonete RAM RAMPAGE R/T, ano 2023/2024.

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