Mudança climática agravou e democratizou alergias – 02/03/2025 – Equilíbrio e Saúde


Cerca de 50% da população mundial sofre atualmente com algum tipo de alergia, e as mudanças climáticas têm contribuído para essa estatística. A conclusão é da World Allergy Organization (Organização Mundial de Alergias), que reúne médicos especialistas de 115 países. O congresso da entidade, que começou na sexta (28) e vai até esta segunda (3), em San Diego (EUA), reúne cerca de 6.000 médicos para debater o tema “Mudanças climáticas e doenças alérgicas: impacto global na saúde”.

Primeiro português a comandar a organização, Mário Morais de Almeida afirma que em seu país há exemplos de como a mudança climática exacerba a incidência de alergias.

“No último ano, tivemos níveis polínicos que nunca tínhamos tido antes em Portugal. E nós medimos níveis polínicos sistematicamente há 30 anos”, disse o médico à Folha. “Foram constatados níveis muito elevados e também por um período mais prolongado, ou seja, estações polínicas que começam mais cedo e acabam mais tarde. Agora não temos pólen só na primavera, mas quase o ano inteiro”, acrescenta Morais de Almeida, que assumiu em janeiro a presidência da Organização Mundial de Alergias, para um mandato de dois anos.

Se os esforços na direção de conter o aumento da temperatura forem bem-sucedidos —o ano de 2024, contudo, foi o primeiro a terminar com média de temperatura acima de 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais—, é possível que o ciclo de polinização volte à normalidade, ele diz.

Morais de Almeida afirma ainda que os eventos extremos provocados pelas mudanças climáticas também entram nessa conta de agravamento das doenças alérgicas.

“Vejamos esses incêndios terríveis que ocorreram na Califórnia, onde se realiza o congresso. As pessoas que respiram aquelas cinzas, aquelas partículas, estarão muito mais suscetíveis a serem alérgicas, a expressarem doença alérgica, doença cardíaca e doença metabólica”, afirma.

De acordo com o médico, as mudanças climáticas vêm agravar um quadro que tornou as alergias doenças típicas do mundo moderno.

“Temos o fator tempo seco e quente, temos queimadas, temos o pólen. Além de tudo isso, as pessoas estão expostas ao trânsito do automóvel. A gente construiu cidades ruins para os nossos pulmões. Há estudos muito interessantes sobre migração que mostram que populações que tinham uma frequência muito baixa de doença alérgica logo aumentavam essa frequência quando se mudavam para uma zona urbana”, diz.

O objetivo do congresso em curso nos EUA, diz Morais de Almeida, é debater esses problemas e propor soluções. Parte das medidas sugeridas, contudo, não deve ser muito diferente do receituário geral para combater os efeitos das mudanças climáticas.

Outras sugestões devem se concentrar na área de saúde pública. A mortalidade por doenças como asma é mais alta em países onde o diagnóstico é mais precário, como em algumas nações africanas. Segundo Morais de Almeida, alguns países europeus controlaram os óbitos com acompanhamento médico constante e especializado.

“Em Portugal nós temos há quase 30 anos um programa nacional de controle da asma, e isso traz resultados. Cerca de cem pessoas morrem por ano de asma no país, habitualmente pessoas com mais de 80 anos. É um número baixo”, afirma. Segundo o médico, Portugal tem uma das médias de idade mais altas da União Europeia, e os óbitos por doenças respiratórias são mais frequentes entre idosos.

Na avaliação do médico, “o processo de urbanização democratizou a alergia”.

“Hoje em dia a frequência de asma que temos em São Paulo, Lisboa e Nova Iorque é mais ou menos a mesma: 10% de asma, 20% a 30% de rinite. Em todas as grandes cidades esses números são parecidos”, afirma. “Infelizmente, a mudança climática, que atinge o planeta inteiro —embora alguns eventos extremos tenham mais probabilidade de ocorrer em alguns países—, vai tornar as alergias ainda mais democráticas.”



Source link

Adicionar aos favoritos o Link permanente.