Tributária: Veto de Lula opõe petroleiras e refinarias – 11/03/2025 – Mercado


O veto do presidente Lula (PT) ao trecho da reforma tributária que isenta as exportações do imposto seletivo colocou produtores de petróleo e refinarias privadas em lados opostos. Os primeiros têm se articulado no Congresso para derrubar o veto, enquanto os segundos tentam o apoio do agronegócio para manter a cobrança.

A disputa se arrasta ainda para mineradoras e municípios minerados, que também medem os impactos do imposto para suas receitas. As empresas dizem que suas operações serão afetadas, enquanto as cidades se queixam da forma como o tributo será distribuído.

O imposto seletivo (IS) foi criado na emenda constitucional que reformou a estrutura fiscal do consumo no país, aprovada no final de 2023. Conhecido como “imposto do pecado”, ele engloba produção, extração, comercialização ou importação de bens ou serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como cigarros e bebidas alcoólicas e bens minerais (no caso, limitados a petróleo, gás natural, carvão mineral e minério de ferro).

A emenda, relatada à época pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM), definia uma alíquota máxima de 1% sobre o valor do produto, mas a lei complementar aprovada no final do ano passado reduziu esse valor para 0,25%. Além disso, a lei isentou as exportações, o que beneficiaria os grandes produtores de petróleo e minério de ferro, dois dos maiores agregadores da balança comercial do país.

Lula, no entanto, vetou esse trecho ao sancionar a legislação em janeiro, iniciando uma corrida entre os setores para reverter a decisão no Congresso. O presidente argumentou que o trecho era inconstitucional, já que a emenda aprovada em 2023 determinava a cobrança do imposto independentemente da destinação do bem extraído.

O veto deve ser analisado no final de março, segundo pessoas que acompanham a discussão. A análise será feita em uma sessão conjunta de deputados e senadores, e a derrubada do veto exigirá o voto de 257 deputados e 41 senadores (independentemente do quórum).

Quando a alíquota ainda era de 1%, o IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo) calculou que o impacto no setor poderia variar entre R$ 6 bilhões a R$ 8 bilhões. Nessa proporção, 0,25% geraria um impacto entre R$ 1,5 bilhão e R$ 2 bilhões. Considerando apenas o valor exportado de óleo bruto, porém, a perda para os exportadores seria de R$ 640 milhões. Questionada, a Fazenda disse que o impacto será “bastante reduzido”.

“A gente está disputando um mercado feroz lá fora e 65% do nosso petróleo hoje vai para a China, que é comprador de vários lugares do mundo”, diz Roberto Ardenghy, presidente do IBP. “Vários países oneram, por exemplo, um pacote de cigarro ou um litro de bebida alcoólica, mas colocar isso em um insumo industrial do início da cadeia é um contrassenso, porque você o joga para dentro de toda a cadeia. Estamos dando um tiro no próprio pé, nos autoimpondo tarifas.”

Cerca de metade dos 3,5 milhões de barris de petróleo produzidos todos os dias no Brasil é exportada. A maior parte desse restante é comercializada com refinarias do país, responsáveis por produzir os derivados de petróleo, como gasolina e diesel.

Por isso, as refinarias privadas, que têm 20% do mercado de refino no Brasil (cerca de 60% é da Petrobras e 20% é importado), temem que isentar as exportações favoreça a venda do petróleo bruto para outros países, reduzindo a oferta para o refino no Brasil.

Isso, em tese, agravaria um problema já apontado pela Refina Brasil, associação que reúne as refinarias privadas, como Acelen e Ream. A entidade diz que normas da ANP (Agência Nacional de Petróleo) já privilegiam a exportação de petróleo bruto para subsidiárias do mesmo grupo fora do país em detrimento da venda no mercado interno.

“Ter o IS só no mercado interno e não cobrar quando o petróleo é exportado desestimula o produtor a vender no mercado interno”, diz Evaristo Pinheiro, presidente da Refina Brasil. “Com o imposto seletivo, o petróleo vai chegar mais caro na refinaria, mas a empresa vai repassar no preço.”

Segundo a associação, se o veto for derrubado, o preço do petróleo refinado por grupos privados no Brasil poderia ficar até 10% mais caro –esse valor não necessariamente seria o aumento registrado nas bombas, já que as empresas privadas são responsáveis apenas por um quinto do combustível de petróleo vendido no Brasil. Além disso, o preço dos combustíveis também inclui imposto, serviços de distribuição, revenda e comercialização. A Petrobras disse que não comentaria o tema.

Para manter o veto, a associação tenta convencer a bancada do agronegócio de que a arrecadação do governo com o IS pode ser direcionada para a produção de biocombustíveis, o que favoreceria produtores rurais. Essa hipótese, porém, precisaria ser acrescentada à Constituição, segundo a Fazenda.

Com o mesmo argumento dos produtores de petróleo, as mineradoras que extraem minério de ferro no Brasil, como Vale, Anglo American e CSN, também têm se movimentado para derrubar o veto de Lula. Segundo o Ibram, o impacto no setor é próximo de R$ 300 milhões com alíquota de 0,25%. Mais de 80% do minério de ferro extraído no país é exportado e, se o IS existisse já no ano passado, as mineradoras teriam que pagar R$ 430 milhões.

“Taxar exportações é uma coisa que não faz sentido, assim como considerar o mineral em um imposto de consumo. Se o veto não for derrubado, não nos resta outro caminho senão a judicialização”, diz Raul Jungmann. Essa, aliás, é a via mais provável, já que estados e municípios devem fazer pressão pela manutenção do veto, uma vez que a arrecadação é compartilhada entre os entes.

Situação ainda mais difícil é a dos municípios minerados, que tentam convencer o governo a revisar a Constituição para que a distribuição do IS privilegie os municípios que abrigam as minas. Isso porque, como os royalties minerários são contabilizados sobre o faturamento das empresas após a dedução de tributos, a arrecadação dos municípios cairá caso o imposto seletivo seja incluído na base de cálculo da dedução.

Um estudo da UFMG encomendado pelos municípios minerados estima que o IS em 1% gerará um aumento de R$ 1,5 bilhão por ano se considerado apenas o minério de ferro (R$ 375 milhões com 0,25%). Esse, portanto, seria o mesmo valor a ser descontado dos royalties.

A UFMG também estima que apenas 1% desse valor retornaria para os municípios minerados caso o atual formato de distribuição do imposto se mantenha. Da arrecadação do tributo, 40% vai para a União e 60% para os Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios (FPE e FPM), aos Fundos Constitucionais de Financiamento do Norte, Nordeste e Centro-Oeste e à compensação de Estados e Municípios pela exportação de produtos industrializados.

“Se o IS não puder ser distribuído para nós, é melhor que o veto caia, porque nós teríamos um prejuízo. Mas, de qualquer forma, o presidente Lula está correto sobre os impactos da mineração; nós sentimos isso na pele”, diz Waldir Salvador, consultor de relações institucionais da Amig (Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil). Os prefeitos tentam também tirar o IS da base de cálculo dos royalties.

Colaborou Nivaldo Souza, de Brasília



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