Mulheres denunciam violência sexual em CAPS terceirizado de Campinas

Receando serem as próximas vítimas da violação de direitos, usuárias dos serviços de saúde mental terceirizados onde surgiram denúncias de violência sexual em Campinas procuraram o jornal A Verdade e o Movimento de Mulheres Olga Benário

Movimento de Mulheres Olga Benário | Campinas (SP)


MULHERES – Na cidade de Campinas (SP), no interior paulista, o jornal A Verdade recebeu denúncias de situações de violação de direitos, inclusive violência sexual, em serviços públicos de saúde mental que foram terceirizados. No mês de abril, várias mulheres relataram ao jornal ter sofrido abuso sexual dentro de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) da cidade. Lamentavelmente, em espaços que deveriam acolher e cuidar de pessoas em sofrimento psíquico, as denúncias de violência estariam sendo acobertadas, dizem as denunciantes, que pediram o anonimato por temer perseguições.

Com receio de serem as próximas vítimas e sentindo-se sem defesa, mulheres assistidas por esses serviços procuraram a Ocupação Maria Lucia Petit Vive, organizada pelo Movimento de Mulheres Olga Benário na cidade de Campinas, com o objetivo de pressionar o poder público a se manifestar e tomar as providências necessárias de proteção às pessoas que dependem dos serviços de acolhimento humanizado e tratamento de saúde mental.

As situações de violência relatadas teriam ocorrido à noite e sido perpetradas por vigilantes contratados de uma empresa terceirizada. “São momentos de terror, principalmente porque quando as mulheres usuárias precisam pernoitar no CAPS é porque estão em sofrimento psíquico agudo e em total vulnerabilidade”, relatou uma mulher à reportagem do jornal A Verdade.

O projeto de gestão do prefeito Dario Saadi (Republicanos), que terceiriza os serviços e desresponsabiliza a prefeitura dos seus deveres para com as cidadãs de Campinas, vai assim fazendo mais e mais vítimas. “Essas mulheres assistidas pelo CAPS deveriam estar sendo cuidadas pelas equipes de enfermagem. Onde estava a equipe de enfermagem? E por que existe vigilante homem numa ala de atendimento a mulheres?”, questiona outra usuária.

Os problemas da terceirização da saúde

Os CAPS são serviços muito importantes no modelo de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS), representando uma conquista da Reforma Psiquiátrica que humanizou o cuidado em saúde mental. Devido ao modelo de gestão compartilhada do SUS, a gestão dos CAPS é responsabilidade da secretaria municipal de saúde.

O Centro de Atenção Psicossocial de Campinas que as denunciantes apontam como espaço onde ocorreram os fatos tem convênio com o Serviço Cândido Ferreira, um antigo manicômio que hoje funciona como uma Organização Social (OS), um dos principais instrumentos da terceirização da saúde aplicada pelos governos neoliberais hoje em dia. Na década de 1920, o manicômio Cândido Ferreira foi criado pela elite campineira para retirar do convívio social as pessoas que necessitavam de tratamento.

Além de terceirizar os CAPS, a prefeitura de Campinas enfraquece o SUS promovendo um modelo de saúde terceirizada, entregando patrimônios públicos como hospitais e UPAs para empresas de direito privado. A Rede Mario Gatti foi criada em 2018 pela gestão do município com o suposto objetivo de garantir o acesso da população a equipamentos como o Hospital Municipal Mario Gatti, o Hospital Ouro Verde e o Hospital Pediátrico Mario Gattinho, mas o que se viu na prática foi muito diferente: os trabalhadores chegam a esperar 12 horas para serem atendidos nas UPAs terceirizadas da cidade.

Devido à grave situação nas UPAs que estão sob a gestão da Rede Mario Gatti, o Ministério Público de São Paulo abriu uma investigação em 2023 para apurar as denúncias sobre a demora do atendimento à população. Foi constatado que os equipamentos terceirizados têm longas filas de atendimento, as agentes para consultas médicas têm meses de espera e faltam materiais hospitalares, médicos e outros profissionais de saúde.

A terceirização da Saúde é um projeto das elites que precariza os serviços para desmantelar o SUS. Para brecar esse sistema brutal, corrupto e desumano que afeta diretamente a vida das mulheres, a luta organizada é o caminho de resistência, indica o Movimento de Mulheres Olga Benário.

Pautas reivindicadas pelas mulheres

Só nos primeiros cinco meses do ano, Campinas registrou seis feminicídios. A conta aumenta para nove, quando se soma a região metropolitana da cidade. O primeiro semestre de 2024 viu uma escalada dos  índices de violência contra as mulheres, reflexo direto do corte de verbas para as políticas públicas de enfrentamento ao feminicídio e à violência de gênero.

Indignadas com as violências diárias e o número de feminicídios em Campinas, as mulheres trabalhadoras estão se mobilizadas para promover, nos quatro cantos da cidade, assembleias e protestos exigindo o fim da violência sexual e uma urgente investigação sobre as violações de direitos nos CAPS terceirizados.

O Movimento de Mulheres Olga Benário denuncia desde 2022 a grave situação da insuficiência de equipamentos públicos e a falta de concursos para ampliar e qualificar os serviços de acolhimento. Em um ano de atuação, a Ocupação Maria Lúcia Petit Vive já acolheu mais de 100 mulheres, sem perder de vista a defesa de uma rede complexa de acolhimento às mulheres em situação de violência.

Indignadas com as violências diárias e o número de feminicídios em Campinas, as
mulheres trabalhadoras estão organizadas para denunciar e cobrar políticas efetivas
em defesa da vida das mulheres, por um SUS para todas e pelo direito de todas as
mulheres a acessar os serviços de saúde com qualidade e em segurança, exigindo o
fim da violência sexual e a investigação das violações de direitos das mulheres nos
CAPS terceirizados.

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