A luta contra o patriarcado na Albânia socialista

A experiência revolucionária da Albânia se destacou por dar centralidade à luta contra o machismo e o patriarcado na construção do socialismo.

Gustavo Rebelo


HISTÓRIA – Ao contrário do que insinuam os inimigos do comunismo, os regimes socialistas deixaram na história um importante legado de luta contra opressões de gênero, raça, religião e outros marcadores de identidade. Cabe a nós, comunistas do presente, aprender sobre essas experiências, assimilar as razões dos seus êxitos e limites, de modo que nossas propostas e práticas políticas possam refletir o acúmulo de anos de experiência das gerações de comunistas que nos antecederam.

Menos conhecida do que merecia, a experiência revolucionária da Albânia se destacou por dar centralidade à luta contra o machismo e o patriarcado na construção do seu projeto socialista. A Albânia é uma pequena nação da região dos Bálcãs (na Europa do Leste) e conta com cerca de 3 milhões de habitantes. Após uma luta encarniçada que expulsou os invasores fascistas italianos e nazistas alemães do seu território na Segunda Guerra Mundial, os comunistas tomaram o poder do estado e deram início à transição socialista no país.

Antes da libertação nacional, a opressão contra a mulher albanesa era brutal. Ela não possuía nenhuma voz dentro da família. Quando noiva, não tinha sequer o direito de chamar seu marido pelo primeiro nome. As mulheres tomavam assento em locais separados dos homens nas igrejas e nas mesquitas, mas mesmo nas salas de estar das casas albanesas costumava-se ter uma separação para os dois grupos. Em algumas regiões, quando uma mulher era mal falada, poderia ter seus cabelos cortados e sofrer humilhações públicas na rua. As jovens mulheres eram frequentemente vendidas, até em idade infantil, para interessados em futuros casamentos.

Desafiando séculos de tradições obscurantistas, o Partido Comunista convocou as mulheres patriotas a se juntarem às forças guerrilheiras antifascistas de libertação, uma ação inédita na história da Albânia. As albanesas assumiram postos de responsabilidade nos destacamentos militares: eram comandantes, comissárias e secretárias de célula do Partido. Dos 70.000 membros do exército partisan, 6.000 eram mulheres.

Iniciada a construção do socialismo, o Partido definiu qual seria o caminho para concretizar a emancipação feminina, estabelecendo duas pré-condições básicas. Primeiro, as mulheres deveriam se livrar da escravidão assalariada. Como todo o povo trabalhador, a mulher proletária sofre com as consequências do capitalismo: insegurança, desemprego, fome, inflação, etc. Com a expropriação da burguesia e implementação da ditadura do proletariado, a mulher albanesa teria superado esta primeira pré-condição.

A segunda se concretiza com a inserção da mulher na produção social do trabalho. Com isso, estaria constituída a base material para a sua emancipação. Esta segunda etapa representou um enorme desafio para a revolução. A taxa de analfabetismo entre as mulheres chegava a 90%, e estas deveriam receber o quanto antes educação básica, capacitação técnica e mesmo formação acadêmica para assumir com equidade em relação aos homens as diversas funções dentro da estrutura produtiva da economia socialista. Nos primeiros anos da década de 1980, as mulheres albanesas já eram 46% da força total de trabalho no país.

Um dos empecilhos para aumentar a participação da mulher na produção social do trabalho e na vida política e social da Albânia era sua sobrecarga com tarefas domésticas. O Partido do Trabalho da Albânia (como passou a ser chamado o Partido Comunista após a revolução) entendia que a completa socialização do trabalho doméstico só seria alcançada após um salto no desenvolvimento industrial do país, o que ainda não era possível. Diante desse impasse, foi promovida uma grande campanha educacional em torno da divisão de tarefas domésticas entre toda a família. O Código da Família, aprovado em 1982, definiu direitos e deveres iguais para todos os familiares, estabelecendo que “os cônjuges apoiam um ao outro no cumprimento de todas as responsabilidades familiares e sociais.”

Com a campanha educacional promovida pelo partido, muitos noivados infantis foram dissolvidos voluntariamente pelos pais. Legislações específicas também foram formuladas para impedir casamentos sem o consentimento mútuo. A Constituição Albanesa de 1976 estabeleceu equidade de pagamentos para homens e mulheres, proibição de privilégios e exclusões em razão do sexo e igualdade de direitos no trabalho, pagamento, férias, previdência social, nas atividades políticas e sociais.

No início dos anos 1980, as mulheres eram 30% do número total de membros do Partido. Assumiram 30% das cadeiras da Assembleia do Povo, o maior corpo governamental do país. Eram 41% dos integrantes do Conselho do Povo, 30% da Suprema Corte, e algo como 44% das lideranças das organizações de massa. Embora estes percentuais não sejam equivalentes ao percentual total de mulheres na população albanesa, restam dúvidas se outro país do mundo à época ostentava números tão próximos da equidade plena em seus espaços de poder e decisão.

Em suma, a fala do camarada Enver Hoxha segue atual e deve nos servir de inspiração dentro da luta revolucionária em nossas fileiras:

“O Partido e a classe trabalhadora devem medir o avanço para a completa construção da sociedade socialista por meio do aprofundamento e progresso da revolução das mulheres dentro da nossa revolução proletária. Se a mulher for deixada para trás, a revolução também se atrasa.”

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