O coração mandou parar, Marquinho Belém obedeceu

A morte do zagueiro uruguaio Juan Izquierdo, de 27 anos, durante uma partida entre Nacional (Uru) e São Paulo pela Libertadores da América, gerou comoção no Brasil e no exterior. O jogador teve uma arritmia cardíaca durante o jogo e faleceu dias depois no Hospital Albert Einstein, em São Paulo.O falecimento do atleta levantou questões na comunidade esportiva sobre a segurança dos jogadores, mesmo daqueles considerados saudáveis. Casos similares são conhecidos tanto no futebol brasileiro quanto internacional. Um dos exemplos mais lembrados é o do meia Serginho, do São Caetano, que morreu em 2004 durante uma partida contra o São Paulo, um mês após ter descoberto o quadro de arritmia. Esse episódio levou à implementação de uma série de protocolos e exames obrigatórios para os jogadores antes do início de cada temporada.

Em Belém, o ex-jogador Marquinho Belém, que atuou por Paysandu, Clube do Remo e Tuna Luso, também enfrentou uma situação delicada. Em 2004, aos 29 anos, foi diagnosticado com Miocardiopatia Hipertrófica Obstrutiva (MHO), uma condição em que o músculo cardíaco se torna anormalmente espesso, o que pode dificultar o fluxo sanguíneo e representar riscos à saúde.“Jamais imaginei que teria que parar de jogar por conta de um problema cardíaco, mas Deus sabe o que faz. Aceitei o aviso para me manter vivo e, meses depois, me tornei comentarista esportivo”, relembrou Marquinho.

Ele lamentou a morte do jogador uruguaio e disse que o ocorrido o tocou bastante, sobretudo pela fase da vida do atleta. “Uma tristeza muito grande, especialmente porque, além da família e amigos que torciam por ele, havia a questão da esposa e dos dois filhos, incluindo um recém-nascido, que dependiam diretamente de Izquierdo. Que o time do Nacional e seu país, o Uruguai, possam dar todo o suporte que sua família merece neste momento tão difícil”, lamentou.

Apesar do diagnóstico, Marquinho recebeu autorização médica para continuar jogando e teve uma temporada destacada em 2005, participando da campanha vitoriosa do Clube do Remo na Série C, que resultou no título nacional e no acesso à Série B, que o jogador foi eleito melhor lateral do futebol paraense e esteve na seleção da Série C daquele ano. Durante essa fase, ele celebrava seus gols batendo no peito, simbolizando que estava bem de saúde e saudável para os torcedores.

No entanto, em 2008, quando estava no Paysandu, sua carreira foi interrompida definitivamente após a recomendação médica de que continuar jogando representaria um risco elevado à sua vida. “Foi um impacto muito forte e inesperado, foi como se tivessem me tirado o chão. Chorei sem parar!”, disse Marquinho, que encerrou sua carreira aos 32 anos.DILEMA MÉDICOO cardiologista Henrique Custódio, que acompanha atletas desde 2000 e tem vasta experiência na área como médico do Clube do Remo e professor da Universidade do Estado do Pará (UEPA), explicou que o procedimento de informar o atleta que ele não poderá jogar mais é um verdadeiro desafio.“Informar um atleta de que ele não poderá mais competir é uma das partes mais difíceis do meu trabalho. É essencial abordar a situação com empatia e clareza, explicando os riscos envolvidos e as razões médicas para a decisão. Também procuro oferecer apoio emocional e discutir alternativas para que o atleta possa permanecer envolvido no esporte de outras maneiras, se possível”, afirmou o médico.Custódio, que teve tese de mestrado justamente na área (Prevenção de Morte Súbita e Doping no Esporte) e teve pesquisa reconhecida pela “British Journal of Sports Medicine”, uma das revistas acadêmicas mais prestigiadas na área de medicina esportiva, ressaltou que, embora os procedimentos de saúde preventiva sejam rigorosos, ainda há um risco, mesmo que pequeno, de problemas cardíacos não serem identificados em exames de rotina.

Cuidado com atletas amadoresA avaliação física completa é primordial, tanto para atletas profissionais, quanto para amadores. Custódio afirma que é sempre importante manter um estilo de vida saudável e atentar para os sinais incomuns que remetem a problemas cardíacos.“Antes de iniciar qualquer atividade física de alto desempenho, tanto atletas profissionais quanto amadores devem passar por uma avaliação médica completa. Isso inclui um histórico médico detalhado, exame físico e testes cardíacos apropriados. Além disso, é importante que os atletas mantenham um estilo de vida saudável, com uma dieta equilibrada e descanso adequado, e estejam atentos a quaisquer sintomas incomuns, como dor no peito ou falta de ar, que devem ser avaliados imediatamente por um profissional de saúde”, destacou.

Marquinho de bem com a vida em BelémJá aposentado dos gramados, o ex-lateral agora aproveita a família, toma a sua cervejinha e bate sua bolinha no final de semana com os amigos. Por mais que o problema ainda exista, a forma recreativa com que o ídolo azulino realiza suas atividades não é um problema para a condição de saúde.“Eu posso jogar uma pelada, posso ir à academia, entende? Posso comer o que quiser e tudo mais. Mas no meu caso, para o esporte de alto rendimento, esse tipo de treinamento em alta performance eu não poderia mais fazer. Porque eu poderia não resistir, seja em um treino ou em um jogo, como aconteceu com o Serginho, do São Caetano, o Izquierdo, e o Bebeto também, que passou pelo Paysandu, foi detectado também. Não sei se ele era baiano ou paulista, mas veio do Bahia para o Paysandu. Enfim, dá para viver uma vida normal. Como dizem, é melhor ser um pobre vivo do que um rico no cemitério. A gente ganha bem, mas a saúde vem em primeiro lugar e poder viver ao lado da nossa família”, destacou o jogador.

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