É possível mudar a nossa personalidade ao longo dos anos? Descubra!

Nos últimos anos, a ciência da personalidade vem desafiando antigas crenças sobre a imutabilidade dos traços individuais. Desde a infância, muitos aprendem que traços de personalidade, como timidez ou extroversão, são características fixas, definidas ao nascimento e mantidas pela vida. No entanto, pesquisadores e psicólogos têm mostrado que essa ideia não reflete a complexidade da personalidade humana. De acordo com estudos recentes, é possível modificar intencionalmente aspectos da personalidade, desde que a pessoa tenha motivação e siga estratégias bem estabelecidas.

Brent W. Roberts, professor de psicologia da Universidade de Illinois, é um dos principais estudiosos da mudança de personalidade na idade adulta. Ele ressalta que muitos ainda veem a personalidade como algo definitivo e imutável. “Os traços de personalidade de fato mudam com a idade”, afirma Roberts. Ao longo de sua carreira, ele estudou como fatores como o tempo e a terapia podem influenciar os traços básicos das pessoas. Uma das conclusões principais é que, se houver desejo de mudança, é possível alterar esses traços.

A pesquisa realizada por Roberts indica que, embora a personalidade seja formada por padrões de pensamento, emoção e comportamento duradouros, esses padrões não são inamovíveis. “Descobrimos que consultar um terapeuta levou a uma redução significativa no neuroticismo em poucas semanas de terapia”, explica. Esses achados desafiam a ideia de que só eventos drásticos e prolongados provocam alterações na personalidade.

Entendendo o que é personalidade

Para compreender como esses traços podem ser alterados, é preciso entender o que exatamente constitui a personalidade. Os psicólogos descrevem a personalidade como um conjunto de traços amplos conhecidos como “Cinco Grandes” (Big Five): neuroticismo, extroversão, conscienciosidade, amabilidade e abertura a novas experiências. Esses cinco traços abrangentes formam a base da maneira como uma pessoa tende a pensar, sentir e se comportar ao longo da vida.

Psicólogos descrevem a personalidade como um conjunto de traços – Foto: Axel Buecker

A personalidade é, portanto, diferente de preferências ou gostos. Por exemplo, gostar de uma banda específica ou de um gênero literário não faz parte da personalidade, pois trata-se de uma preferência e não de um traço persistente. Assim, segundo Roberts, a personalidade é mais profunda e envolve padrões que são demonstrados em diversas situações.

O que pode motivar uma mudança de personalidade?

O fator essencial para uma mudança duradoura na personalidade é a motivação. “É preciso querer mudar”, reforça Roberts. Sem um desejo real de transformação, as tentativas de alterar o comportamento tendem a ter efeito passageiro. A motivação é a base que permite a uma pessoa se esforçar para adotar novos comportamentos, mesmo que inicialmente eles pareçam desconfortáveis.

Por exemplo, uma pessoa que deseja se tornar mais assertiva precisa começar a praticar a defesa de suas opiniões em situações cotidianas. “Muitas vezes, o que as pessoas realmente querem não é ser menos amáveis, mas mais assertivas”, comenta Roberts. A assertividade é uma habilidade que pode ser aprendida e aperfeiçoada, permitindo que a pessoa expresse suas opiniões sem agressividade.

A abordagem mais usada para incentivar mudanças de personalidade baseia-se em técnicas cognitivo-comportamentais. Esses métodos envolvem duas etapas principais: a reestruturação dos padrões de pensamento e o teste de novos comportamentos. A reestruturação cognitiva permite que a pessoa identifique pensamentos que a mantêm presa a certos traços indesejáveis. Se alguém acredita, por exemplo, que “as pessoas só pensam em si mesmas”, tende a ser defensivo, o que impacta suas interações sociais de maneira negativa.

O passo seguinte envolve o teste de novos comportamentos. A pessoa precisa experimentar ações que desafiem seus padrões atuais. Quem se sente naturalmente mais fechado pode, por exemplo, tentar compartilhar dificuldades com um colega de trabalho, explorando como isso muda a dinâmica da relação. Roberts salienta que essa prática precisa ser constante para se tornar um traço novo e duradouro.

Estudos sobre intervenções cognitivo-comportamentais mostram que, em cerca de 20 semanas, é possível observar mudanças consistentes nos traços de personalidade. Esse processo depende do estabelecimento de novos padrões mentais e da prática de novos comportamentos, os quais, ao longo do tempo, tornam-se automáticos e naturais.

A importância da prática constante

A aplicação prática é um dos fatores cruciais para a mudança de personalidade. Roberts usa o termo “psicoeducação” para descrever o aprendizado teórico sobre como uma pessoa pode mudar, mas ele reforça que isso, por si só, não é suficiente. A transformação ocorre quando a pessoa tem oportunidades de aplicar os novos comportamentos na vida real.

Essa prática requer tentativa e erro, o que inclui momentos de falha e de superação. A ausência dessas experiências de aplicação prática pode fazer com que a pessoa desista antes de consolidar os novos traços. Por exemplo, alguém que deseja ser mais pontual precisa, além de aprender a importância da pontualidade, colocar em prática estratégias, como o uso de lembretes e alarmes, para ver se consegue cumprir esse objetivo repetidamente.

Outro fator que pode ajudar na mudança é o apoio de outras pessoas. Um terapeuta, coach ou até mesmo um amigo pode ser uma figura fundamental nesse processo. “Não acho que tenha que ser necessariamente um humano”, diz Roberts, “mas é preciso algum tipo de sistema que ajude a pessoa a se manter responsável”. Ferramentas tecnológicas, como a inteligência artificial, também podem servir como apoio, ajudando a pessoa a se manter motivada e focada.

Embora os estudos mostrem que a personalidade pode ser transformada, Roberts lembra que o processo requer tempo e paciência. Algumas mudanças são mais rápidas do que outras, mas os resultados só se tornam duradouros se houver dedicação. Ele observa que técnicas comportamentais não mudam apenas as ações; elas podem, sim, alterar a personalidade em si.

A ciência da personalidade ainda tem muito a explorar. No entanto, para aqueles que desejam mudar, os avanços sugerem que é possível tornar-se mais confiável, assertivo ou extrovertido. Com prática, motivação e apoio, a personalidade pode ser moldada, permitindo que cada pessoa se aproxime da versão de si mesma que deseja alcançar.

 

 

 

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