Alugar escritório ficou mais complexo, diz CEO da Newmark – 21/02/2025 – Mercado


O trabalho pós-pandemia mudou a forma como as empresas se relacionam com seus funcionários, que hoje adotam jornadas de trabalho híbrido ou de home office puro, e transformou também a forma como grandes companhias buscam escritórios e galpões de alto padrão.

“As empresas não estão alugando mais 1 para 1 [um lugar para cada funcionário]”, diz a CEO da operação brasileira da consultoria imobiliária norte-americana Newmark, Marina Cury, 52. Segundo ela, o trabalho era mais fácil: bastava multiplicar por dez ou 12 o total de colaboradores da empresa e encontrar o melhor prédio disponível para receber a operação naqueles metros quadrados.

Hoje, isso não existe mais. Além de bons espaços, as empresas precisam oferecer algo a mais do que apenas uma mesa para o funcionário e são poucos os prédios que ainda alinham espaço de sobra e alta tecnologia.

À Folha, Marina afirma que a pressão pela volta ao presencial é muito forte. São Paulo, que concentra o maior mercado de escritórios de alto padrão do país, registrou no ano passado a maior ocupação da história após a alta demanda das empresas por novos espaços.

No segmento logístico, que foi diretamente catapultado pelas empresas de ecommerce, a mudança de padrão veio com a maior aproximação das empresas rumo às capitais, que são mais caras, mas diminuem o tempo de entrega final.

Descendente de libaneses, herdeira de uma empresa familiar, ela tinha tudo para fazer carreira na empresa fundada pelo pai, a Cury, hoje uma das queridinhas do segmento imobiliário na B3, mas decidiu abrir mão dos negócios da família para crescer no ramo da consultoria. “Hoje eu sou empreendedora tanto quanto eles”, afirma.

Única CEO mulher da Newmark no mundo, ela foi a responsável por trazer a consultoria imobiliária para o Brasil, dez anos atrás, e ajudou a consolidar o processo de expansão da multinacional na América Latina.

Focada no mercado de alto padrão, a consultoria presta serviços de gestão de ativos imobiliários e de projetos, facilities (a parte operacional dos prédios), inteligência e dados, além de avaliações imobiliárias.

Entre os clientes estão o Nubank e a química Dow.

Quais são as perspectivas da Newmark para o mercado de escritórios de alto padrão para este ano?

Antes da pandemia, quando um cliente falava que queria mudar de escritório, a gente multiplicava o número de funcionários por dez ou por 12 e dava a área que ele precisava para um escritório. Esse era um número que todo mundo no mercado conhecia. Era muito fácil. Eu buscava o prédio, procurava as especificações do cliente, alinhava questões técnicas e achava esses espaços. Hoje não é mais assim.

A gente sente uma pressão, na maioria das empresas, pela volta do presencial, mas acho pouco provável que essa volta será de cinco dias por semana. Tem empresas que estão trabalhando uma ou duas vezes no presencial, outras com três ou quatro e esquema de rodízio.

Mesmo com essa taxa de vacância reduzida, as empresas não estão alugando mais 1 para 1 [uma posição para cada funcionário]. A cada cem empresas, 90 não possuem mais um lugar para cada funcionário. Multinacionais com tamanhos como os da Unilever, Nestlé, que têm 10 mil funcionários, não tem como alinhar todo mundo. Não é só a conta que fica cara, mas eles também estão adotando sistemas combinados [de jornada de trabalho]. Isso vai funcionar para sempre? Agora ainda é um teste, mas está funcionando.

Com os galpões logísticos de alto padrão houve muita mudança de perfil?

Antes da pandemia, a gente ia para os galpões mais próximos de São Paulo, como Guarulhos e Cajamar, que a gente brinca que era a “Faria Lima dos galpões”. Esse conceito de entrega rápida já existia, mas não era como hoje. Tudo ficou mais acelerado. No Brasil a gente não falava do last mile, a última milha, que é o mais próximo da entrega final. A pandemia acelerou isso. É uma mudança. A gente viveu várias crises no Brasil, mas essa [Covid-19] foi a única crise comportamental. Ela mudou o comportamento das pessoas e das empresas. Isso levou a outra necessidade, a de entregar mais rápido. A mudança no Plano Diretor, que repaginou o a lei de zoneamento e permitiu a construção de mais galpões, também ajudou.

No setor logístico, a maior mudança foi a maior proximidade para São Paulo. Cajamar tem uma média de R$ 30 o metro quadrado. Se você pegar esse mesmo tipo de galpão, tirar ele com um guindaste e colocar dentro de uma zona no município de São Paulo, ele vale R$ 45. Esses R$ 15 a mais são de uma demanda de espaço de mercado que não existia, de estar mais perto. Se você colocar quatro desses galpões em cada canto da cidade, vira um diferencial. Apesar dessa mudança na demanda, isso não quer dizer que as empresas vão deixar Cajamar, até porque R$ 15 é uma diferença muito grande, de preço e de logística.

Os clientes de vocês são empresas de altíssimo resultado. Quais são as principais demandas desse universo?

Temos clientes com demandas para escritório e o setor logístico. Não trabalhamos com residencial, exceto avaliação de preço de terreno para bancos, e vendemos terrenos também, do altíssimo padrão ao Minha Casa Minha Vida. Os escritórios têm essa demanda por espaço e boas localizações. Os galpões também buscam localização, mas entram questões mais específicas como ter um pé direito alto, não estar em áreas com alagamentos. O setor foi evoluindo, os estoques ganharam mais qualidade. Também temos clientes industriais, com outros tipos de demandas, como incentivo fiscal e locais com potencial de geração de emprego, por exemplo. Nesses casos a gente olha do ponto de vista financeiro, de qual cidade tem a capacidade de receber uma operação. Aí achamos o terreno, a incorporadora e fazemos um projeto de acordo com o cliente.

Mais da metade do quadro de funcionários de vocês é composto por mulheres. Você é a única CEO mulher da Newmark no mundo. Esse case é um ponto fora da curva ou você sente uma mudança no mercado imobiliário?

É um ponto fora da curva porque elas não são muitas por aí. Aqui, na alta gestão, 67% é mulher, mas tem muito homem também. Esse mix é importante. Digo que não teve um cálculo, teve afinidade. E também não é uma questão de pauta, mas o primeiro item que coloco como importância é ‘como é que a gente vai crescer uma empresa se a gente pensa tudo igual?’. A média de idade da liderança no mercado imobiliário é de homens acima dos 50 anos. E tem problema nenhum nisso, mas não pode ser só isso. Brinco que sou meio rebelde na família Newmark internacional, mas eu tenho voz e tenho coro. Tenho levando esse case lá para fora e mostro que temos sucesso.

Você vem de uma família de empreendedores, seu pai fundou a Cury, incorporadora que caiu nas graças do mercado financeiro nos últimos anos. Como foi explicar em casa que você não seguiria o negócio familiar?

Eu fiz engenharia para trabalhar com a família. A primeira pessoa que estranhou foi a minha mãe, ela perguntou se fiquei louca, mas meu irmão ter feito engenharia foi mais normal para eles. Cheguei a trabalhar com a família, mas queria me provar fora dali. Optei por não ir para uma incorporadora e acabei indo para a Cushman, que era uma empresa que eu não conhecia e com prestação de serviço, completamente diferente de uma incorporadora. Era uma empresa multinacional, com compliance. A empresa do meu pai era de capital fechado, familiar. Meu pai fazia as contas na calculadora, isso não existe mais.

No começo dos anos 2000, quando comecei a ir bem na Cushman, meu pai morreu. Tive que tomar a decisão de voltar para a empresa da família ou continuar fora. Naquele momento eu já tinha passado de estagiária para gerente, com a perspectiva de virar diretora. Acabei seguindo meu caminho. Você pode perguntar se eu me arrependo e acho que não, porque gosto do que faço. Acabei descobrindo que a minha vocação não está na área de desenvolvimento e construção. A minha família me deu uma base de veia empreendedora que eu não sabia que tinha. Hoje eu sou empreendedora tanto quanto eles. Além do Fábio [CEO da Cury Construtora], tenho mais dois irmãos, os dois empreendedores também. Só eu era mulher e só eu executiva. Acabei mostrando que tenho o mesmo DNA da família, que não sou adotada como eles brincavam (risos).


RAIO-X | MARINA CURY, 52

Formada em engenharia civil pelo Mackenzie, Marina Cury teve passagens pelas construtoras Boghosian, Cury e pelo Banco Patente. Na Cushman & Wakefield, onde fez boa parte de sua carreira, ficou 14 anos e ocupou cargos de diretoria. Desde 2014, é CEO da Newmark no Brasil.



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