Extrema direita alemã tem melhor votação em 80 anos – 23/02/2025 – Mundo


Pesquisas de boca de urna apontam que o partido de extrema direita AfD (Alternativa para a Alemanha) foi o segundo mais votado nas eleições alemãs deste domingo (23), obtendo cerca de 20% dos votos —o melhor resultado para uma sigla deste campo político desde o fim do nazismo há 80 anos.

Trata-se de um acontecimento histórico, capaz até mesmo de ofuscar a vitória da CDU (União Democrata-Cristã), de centro-direita. Liderados por Friedrich Merz, provável futuro primeiro-ministro, a sigla obteve 28% dos votos, segundo levantamentos, se tornando o partido mais votado e obtendo, assim, preferência na formação de um futuro governo.

O SPD do atual premiê, Olaf Scholz, amargou seu pior resultado da história da Alemanha pós-guerra, caindo a 16%. Ainda não está claro se o social-democrata renunciará à Presidência de seu partido, como é comum em casos assim. Os Verdes obtiveram 12% dos votos e A Esquerda, 8%.

Em 2013, primeiro ano no qual concorreu ao Parlamento federal, a AfD obteve pouco menos de 5% dos votos. Em 2017, nas eleições seguintes, mais do que dobrou o desempenho anterior e alcançou 12%, resultado que não conseguiu repetir nas últimas eleições, marcadas por uma vitória expressiva do SPD de Scholz e nas quais a AfD obteve pouco mais de 10%. Agora, atinge um patamar inédito, com 20%.

Com o resultado, a AfD não apenas se consolida como força política relevante no país, mas também deve ganhar protagonismo na oposição: graças à estratégia dos partidos democráticos de se recusar a formar governo com os extremistas, a AfD quase certamente será a maior sigla no Parlamento fora do poder.

Após os resultados apontarem a vitória de seu partido, Merz repetiu a promessa de que não formará governo com a extrema direita. Ainda assim, a depender do grau de instabilidade do próximo governo alemão, é provável que a AfD angarie ainda mais apoio eleitoral até as próximas eleições, que podem ser antecipadas se houver crise na coalizão de turno.

Além disso, quanto maior a parcela do voto, mais difícil será para o campo democrático encontrar configurações que excluam a sigla. O resultado desse domingo, por exemplo, já abre à AfD a possibilidade de oferecer à CDU, como Weidel fez neste domingo, um acordo tácito de tolerar um governo de minoria caso os conservadores não consigam acordo com o SPD ou os Verdes. Isso daria aos extremistas grande poder de ditar os rumos do país mesmo tecnicamente fora das rédeas do Estado.

Esse cenário é improvável, visto que a CDU já governou com o SPD muitas vezes e poderia facilmente fazê-lo de novo, inclusive com apoio dos Verdes. Mas há complicações: alas da CDU se recusam a governar com o partido ambientalista, a quem consideram inimigos da indústria e do carro. E o próprio Scholz, neste domingo, aumentou o grau de incerteza ao dizer que não liderará seu partido e deixará a política se o SPD entrar em um governo liderado por Merz.

Para acumular ganhos eleitorais tão expressivos ao longo dos anos, a AfD, que nasceu como um movimento contrário à União Europeia, investiu pesado na hostilidade a imigrantes como principal bandeira. A AfD explodiu em popularidade surfando em sentimentos anti-imigração após a crise migratória de 2015, quando 1 milhão de refugiados foram aceitos no país pelo governo Angela Merkel no contexto da guerra na Síria.

Entre eleições para o Parlamento federal em Berlim, a AfD passou a última década construindo uma fortaleza política nos estados que compunham a antiga Alemanha Oriental, chegando em 2024 a partido mais votado em um deles, a Turíngia. Especialistas apresentam diferentes explicações para o fenômeno, como a maior pobreza nesses estados, o menor contato das pessoas com imigrantes em seu dia a dia e até mesmo diferenças na reflexão sobre o passado nazista.

A AfD é monitorada nacionalmente pelo serviço de inteligência interno da Alemanha por conta de seu caráter radical, e seus diretórios na Turíngia, na Saxônia e na Saxônia-Anhalt são oficialmente considerados extremistas —ou seja, as autoridades alemãs consideram que seus objetivos políticos são incompatíveis com a democracia, o que pode abrir a porta para o banimento do partido.

Também por isso, até aqui, o tabu de ser o partido que permitiria a volta da extrema direita ao poder pela primeira vez desde o fim da Segunda Guerra Mundial parece manter o Brandmauer, ou firewall, contra a AfD de pé por enquanto —ainda mais em um momento no qual comparações entre 2025 e 1933, ano no qual Adolf Hitler chegou ao poder, ganham força.

Isso se deve principalmente ao candidato da CDU, Friedrich Merz, principal vitorioso da noite de domingo. Semanas antes da votação, Merz orientou seu partido no Parlamento a aprovar uma lei, com o apoio da AfD, restringindo a imigração na Alemanha —na votação seguinte, graças à oposição de alguns poucos parlamentares da CDU, a proposta foi derrotada, mas foi a primeira vez na história moderna da Alemanha que a centro-direita colaborou com a extrema direita.

O caso que acendeu alertas (ou, no caso dos extremistas, alimentou esperanças) para a possibilidade de um governo formado pela CDU e pela AfD, que teria, com os resultados do domingo, ampla maioria no Parlamento.



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