Casas de repouso recriam passado para pessoas com demência – 01/03/2025 – Equilíbrio


O berçário do Residencial RiverSpring, no bairro do Bronx, em Nova York, é um espaço iluminado e acolhedor, equipado com dois berços —um deles do tipo moisés, com móbile musical—, alguns brinquedos, mamadeiras, livros ilustrados para a hora de dormir e um cabideiro com roupas de tamanho minúsculo.

Certa manhã, Wilma Rosa estava lá tentando acalmar um de seus pequenos e inquietos bebês. “O que foi, neném? Você está bem? Vamos dormir um pouquinho”, murmura ela, dando tapinhas leves nas costas do reclamão.

Rosa, de 76 anos, residente de cuidados de memória em uma moradia assistida, visita a creche diariamente. Tem bastante experiência com bebês. Por ser a mais velha de oito irmãos, assumiu muitas responsabilidades na família, como conta Catherine Dolan, diretora de atividades recreativas do local, que faz perguntas para estimular suas lembranças. Mais tarde, Rosa trabalhou em um banco e em uma loja; as histórias surgem enquanto ela embala a boneca.

Nenhum bebê de verdade vive nesse ambiente imersivo, onde a mistura de fragrâncias inclui um aroma de talco. Também não houve nenhuma venda na loja no fim do corredor, outra iniciativa recente da RiverSpring. Entre as prateleiras de madeira com roupas, acessórios e bugigangas, os atendentes eram, assim como Dolan, membros da equipe treinados para interagir de forma eficaz com os moradores com demência.

“Boa escolha. Perfeito para este clima. É muito quente. E tem um bom tamanho. Você pode usá-lo com qualquer casaco”, diz alegremente o caixa —Andre Ally, coordenador de programas interativos— a um homem de 91 anos que havia escolhido um cachecol xadrez. O comprador entrega um cartão de plástico que fora dado aos moradores, sem nenhum valor monetário, e sai com seu andador, contente com seu acessório novo.

David V. Pomeranz, presidente e CEO da RiverSpring Living —cujo campus inclui moradia independente e assistida, cuidados de memória, reabilitação e uma casa de repouso—, vê esses esforços como maneiras de “restaurar a normalidade para as pessoas que foram privadas de muita coisa”. Explica que levar um grupo de moradores com demência a uma loja de verdade poderia gerar estímulos em excesso e que eles não poderiam simplesmente ir embora quando se sentissem cansados.

“Mas uma loja ou um berçário semiverdadeiros proporcionam a eles experiências de vida que são familiares, confortáveis, empoderadoras, e que reduzem a sensação de que não têm controle sobre sua vida.”

Essa estratégia tem defensores —e alguns críticos. Há algumas décadas, os cuidadores de pessoas com demência, em casa ou em centros especializados, adotavam uma abordagem muito diferente. Seu método era a “orientação para a realidade”. Lembrar, por exemplo, os pacientes de que hoje é terça-feira, não quinta. De que não podiam “voltar para casa” porque esta havia sido vendida. De que seu cônjuge não podia fazer uma visita porque morrera anos antes (provocando novamente comoção e dor a cada repetição).

“Não funcionava. Não ajudava na memória, não facilitava a adaptação, não era útil”, afirma Steven Zarit, professor emérito da Universidade Estadual da Pensilvânia e pesquisador de longa data da área de prestação de cuidados e da demência.

Em vez disso, os cuidadores passaram a adotar amplamente uma estratégia, às vezes chamada de “mentira terapêutica”, que evita de maneira sutil as perguntas dolorosas. Onde está um ente querido (falecido)? “Com certeza, vai chegar em breve. Você sabe como é o trânsito. Vamos dar um passeio enquanto esperamos.”

A introdução de animais de estimação robóticos que ronronam e latem, e de bonecos de bebê para cuidar, ampliou essa abordagem. Sobretudo quando a pandemia restringiu outros tipos de interações, algumas pessoas com demência pareciam apreciar esses companheiros de brinquedo.

Criar ambientes inteiros que evocam o passado ou apenas permitir que as pessoas sintam que participam do presente parece ser o próximo passo. Em 2018, o Centro Glenner de Alzheimer para Famílias, organização sem fins lucrativos, desenvolveu o programa diurno para adultos chamado Town Square, que reproduz a rua principal de uma cidade pequena dos anos 1950 dentro de um galpão grande em Chula Vista, na Califórnia.

O local conta com uma lanchonete retrô para as refeições, uma biblioteca com o retrato de Dwight D. Eisenhower, um espaço que imita uma sala de cinema da época e elementos como um Thunderbird de 1959 e uma cabine telefônica antiga. Os franqueados abriram nove Town Squares semelhantes em sete estados, e há outros em desenvolvimento.

Os programas diurnos demonstraram ser benéficos para os participantes com distúrbio cognitivo e seus cuidadores. “Esse ambiente nos permite aprofundar a terapia de reminiscência”, diz Lisa Tyburski, diretora de marketing do Glenner, em referência ao uso de estímulos e objetos para incentivar as lembranças e a comunicação. “Para os participantes, poder conversar a respeito de alguma coisa de que se lembram traz uma sensação de paz enorme. Vemos sorrisos, risadas, amizades se formando.”



Source link

Adicionar aos favoritos o Link permanente.