Razões para evangélicos comemorarem o Oscar – 03/03/2025 – Cotidiano


A alegria tomou conta do Brasil com o Oscar de “Ainda estou aqui”. Lavamos a alma! E os evangélicos? Será que também conseguem se reconhecer nessa história? Ou continuam ouvindo as vozes que condenam o filme e a festa?

Apresento aqui dez razões para aprofundar a reflexão e a comemoração:

1. O filme traz uma história verídica que, tal como as histórias do Antigo Testamento sobre a escravidão no Egito e o exílio na Babilônia, devem ser rememoradas para evitar repetições de erros. (Salmos 79 e 137)

2. Como religião da verdade, da vida e do amor, o cristianismo não defende nenhum tipo de violência, antes é sua vítima. Como expressa Vera Paiva, primogênita do casal: “Nenhuma religião é a favor disso [tortura], muito menos a cristã em nome de Cristo, ele que morreu torturado na cruz”.

3. O filme resgata a história de um homem que não abriu mão de falar e viver segundo suas convicções. O deputado Rubens Paiva foi um dos primeiros políticos a denunciar o golpe militar de 31 de março de 1964. Foi cassado e pagou a coragem com a própria vida. Nesse ínterim, não se furtou a auxiliar as famílias dos perseguidos. Alguma semelhança com o profeta Jeremias, que sofreu tortura e prisão porque denunciou os abusos das autoridades? (Jeremias 38-41)

4. O cristianismo valoriza o papel da família como núcleo central da vida. Temos aqui uma família que se ama, se apoia e se protege, que construiu uma rede de cuidado mútuo que se espraiou, ajudando outros afetados por muitas violências. E agora abençoa todo país com sua história.

5. Eunice Paiva viveu o mistério cristão de transformar morte em vida. Graças a sua coragem e sabedoria, enfrentou truculências, silêncios e entraves de toda ordem até saber a dolorosa verdade. Eis uma mulher que, segundo o papel lhe atribuído no Gênesis, confrontou os homens quando estes estão equivocados.

6. O filme não mostra, mas Eunice também foi consolada por sua fé. Sua filha Vera conta que “No Alzheimer, minha mãe fazia questão de falar alto na hora do Pai-Nosso, quando a gente ia à missa. Ela rezava com a mão para cima e no final dizia: meu maridinho também morreu torturado como meu Cristinho”.

7. Quando cristãos integram em sua fé que a morte de Jesus ocorreu por violência de Estado, também são ajudados a elaborar seus sofrimentos. A psicóloga Marilena Marasca nos traz o testemunho de reconciliação da evangélica Maïti Girtanner, duramente torturada pela Gestapo. O teólogo Everton Bootz apresenta o caminho místico do padre Franz Jalics, torturado na ditadura argentina.

8. O psicólogo e biblista Karl Kepler destaca que o livro “Lamentações de Jeremias” mostra o papel importantíssimo do ato de lamentar para a elaboração de dores. Ele sugere que façamos nossos próprios lamentos e paradas para expressar nossa consternação perante traumas individuais e coletivos.

9. Como integrante do Projeto Clínicas do Testemunho, que durante o governo Dilma escutou pessoas afetadas pela violência de Estado, presenciei o efeito libertador dessa escuta. E mais: segundo Freud em “Além do Princípio do Prazer”, a expressão da dor do trauma retira a pessoa e o grupo do circuito doentio da repetição.

10. “É preciso que haja um pastor nessa comissão”. Este o convite que o Dr. Oneide Bobsin da Faculdades EST recebeu do governador Tarso Genro para integrar a Comissão Estadual da Verdade. Oneide fez mais: conversou e documentou os luteranos afetados pela ditadura, e também o efeito curativo dessa escuta.

Precisamos de mais motivos? Os leitores e as leitoras podem continuar a lista…



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