Milhares de mulheres vieram antes de mim – 10/03/2025 – Natalia Beauty


Se eu voltasse no tempo, encontraria minha mãe. E antes dela, minha avó. E antes dela, minha bisavó. Se continuasse voltando até o início da humanidade, encontraria milhares de mulheres na minha árvore genealógica que vieram antes de mim. Minhas ancestrais. Mulheres que viveram, amaram, sofreram e resistiram para que eu pudesse estar aqui. Cada uma delas carregava em si um fragmento dessa história. Cada uma lutou como pôde. E juntas, sem perceber, criaram algo que nenhuma teria conseguido sozinha: eu.

Minha mãe cresceu acreditando que o destino de uma mulher era casar e servir. Não porque alguém a obrigou, mas porque essa era a única possibilidade que ela conhecia. Ser esposa, ser mãe, ser devota à casa e à família. Não havia opção. Era simplesmente o que se esperava de uma mulher. Ela viu o mundo mudar e percebeu que talvez houvesse outro caminho, mas não teve muitas oportunidades. Então, fez o que pôde para que eu pudesse ser diferente.

Eu cresci ouvindo um discurso oposto. Me disseram que sucesso era fazer carreira. Que uma mulher independente não precisa de ninguém. Que liberdade era sobre poder pagar minhas próprias contas. O mundo parecia mais moderno, mas o peso continuava ali. Minha mãe carregava o fardo do lar e da dependência. Eu carregava o fardo da produtividade e da independência. No fim, ainda éramos medidas pelo quanto dávamos, pelo quanto resistíamos, pelo quanto suportávamos. Apenas mudaram as correntes.

A história feminina é uma sucessão de lutas invisíveis. Minhas ancestrais enfrentaram violência, desigualdade, silenciamento. Para que hoje eu pudesse votar, estudar, decidir por mim mesma. Mas a luta está longe de terminar. As mulheres ainda são assassinadas diariamente apenas por serem mulheres. Ainda recebem menos que os homens pelos mesmos cargos. Ainda acumulam a maior parte do trabalho doméstico e do cuidado com os filhos. Ainda precisam lutar para serem ouvidas na política, nos negócios, na sociedade.

Se milhares de mulheres vieram antes de mim, o que eu faço com isso?

Minha resposta foi clara: criei a Beauty University porque acredito que a independência financeira é a primeira e mais importante liberdade que uma mulher pode conquistar. Quando uma mulher pode se sustentar, pode escolher seu próprio caminho. Pode sair de um relacionamento abusivo sem medo de passar fome. Pode sonhar maior. Pode decidir o que quer sem precisar da permissão de ninguém.

Já formei mais de 20 mil mulheres. Mas isso não é o suficiente. Então, levo essa missão para dentro das penitenciárias femininas, porque sei que a sociedade não dá segundas chances para mulheres que erram. Lá dentro, capacito mulheres em ressocialização para que, quando saírem, tenham uma profissão e uma nova chance.

Também levo essa transformação para a Casa da Mulher Brasileira, onde vítimas de violência tentam reconstruir suas vidas. E para a Fundação Casa, onde meninas que cometeram erros precoces podem ressignificar suas histórias antes que o mundo as condene para sempre.

Liberdade nunca foi um presente. Minhas ancestrais não eram livres. Mas fizeram o que podiam. Lutaram com as armas que tinham. Sofreram caladas para que eu pudesse falar. Foram silenciadas para que eu tivesse voz.

Agora sou o ponto mais alto dessa jornada. E a pergunta que me faço todos os dias é: como honrar as mulheres que vieram antes de mim?

Não vou desperdiçar as oportunidades que minhas avós sequer puderam sonhar. Não vou aceitar as desigualdades como algo normal. Não vou ensinar minha filha a repetir os mesmos ciclos.

Se milhares de mulheres sofredoras vieram antes de mim, devo a elas uma coisa: honrar o caminho que abriram e continuar abrindo caminho para as que ainda virão.

Que as nossas filhas, netas e bisnetas possam viver em um mundo onde o Dia Internacional da Mulher seja apenas uma celebração, e não um lembrete do quanto ainda precisamos lutar.

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