China não quer Irã fragilizado na disputa contra Ocidente – 14/03/2025 – Igor Patrick


China, Irã e Rússia se reuniram em Pequim nesta sexta-feira (14) para discutir o programa nuclear iraniano e reafirmaram sua oposição às sanções e ameaças ocidentais. O encontro ocorreu após a tentativa frustrada do governo Trump de retomar negociações diretas com Teerã, que rejeitou o diálogo sob pressão.

É mais um passo na forma como os chineses projetam poder geopolítico além do Indo-Pacífico. Enquanto os EUA endurecem sua retórica em favor do governo reacionário no poder em Israel, Pequim (e, em menor medida, Moscou) tem oferecido respaldo diplomático a Teerã, reforçando a narrativa de que há alternativas à abordagem ocidental.

A China não deseja um Irã com bombas nucleares —isso desestabilizaria a região, aumentaria os riscos para seu próprio suprimento energético e incentivaria outros países a seguirem o mesmo caminho. Mas o regime chinês tampouco quer um Irã fragilizado a ponto de se dobrar à pressão ocidental.

O interesse é estabelecer um país funcional, resistente às sanções, mas ainda dependente de sua parceria com Pequim. A Xi Jinping interessa garantir que o Irã permaneça suficientemente forte para desafiar a hegemonia americana, mas não a ponto de se tornar incontrolável.

Essa postura explica por que continuam comprando petróleo iraniano, a despeito das sanções ocidentais. Cerca de 15% do petróleo que os chineses consomem vem do Irã, adquirido a preços reduzidos, em um arranjo que mantém a economia iraniana respirando e, ao mesmo tempo, reforça a dependência de Teerã em relação a Pequim.

Para Washington, esse realinhamento é um problema crescente. A estratégia de “máxima pressão” sobre o Irã, revivida por Trump, perde eficácia quando China e Rússia garantem aos iranianos um suporte econômico e diplomático que neutraliza parte dos efeitos das sanções.

A Casa Branca de Biden tentou voltar à mesa de negociações, mas enfrentou uma dinâmica mais complexa do que a de 2015: se antes o Ocidente conseguia ditar os termos do jogo, hoje precisa lidar com um eixo sino-russo fortalecido e um Irã menos isolado do que Washington gostaria.

A grande questão agora é até onde Pequim está disposta a ir. A diplomacia chinesa até aqui joga com habilidade, apresentando-se como mediadora, sem pressionar Teerã a recuar em seu avanço nuclear, apoiando o país contra as sanções, mas evitando confrontos diretos com os EUA.

É um papel que pode funcionar no curto prazo, mas carrega riscos. Se o Irã cruzar o limiar do enriquecimento de urânio em nível militar, Pequim terá de decidir se mantém sua defesa do diálogo ou se cede à pressão internacional para endurecer sua posição. Do seu posicionamento dependerão conversas além do Oriente Médio, como as que envolvem o desarmamento na Coreia do Norte, além de arriscar uma potencial corrida armamentista na vizinhança imediata (em especial Coreia do Sul e Japão).

Como tem sido praxe nos últimos meses com a volta de Trump, está em jogo a própria arquitetura do poder global. O Ocidente ainda tenta operar sob a lógica de que pode impor condições unilaterais, mas Pequim está demonstrando que o mundo não gira mais exclusivamente em torno de Washington.

Se o presidente republicano não souber lidar com essa nova realidade (e tudo leva a crer que não sabe), corre o risco de ver sua diplomacia coercitiva perder força —e, nesse processo, assistir à ascensão de um sistema internacional no qual os americanos já não ocuparão o centro incontestável do tabuleiro.


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