Lollapalooza resiste ‘entre mortos e feridos’, diz diretor – 27/03/2025 – Ilustrada


“Entre mortos e feridos, o Lollapalooza resiste.” É o que afirma Marcelo Beraldo, diretor artístico do evento, às vésperas de sua edição de 2025, a 12ª desde que desembarcou no Brasil. Com Olivia Rodrigo, Justin Timberlake e Shawn Mendes entre as atrações, o festival vai ocupar o Autódromo de Interlagos, em São Paulo, de sexta a domingo.

O evento reflete um paradoxo. Nunca houve uma demanda tão grande por música ao vivo e, ao mesmo tempo, a desvalorização do real perante o dólar dificulta a contratação de artistas estrangeiros relevantes. A pandemia fez disparar os cachês dessas estrelas, e a concorrência aumentou.

“O cenário é de cancelamentos de festivais e shows —muitos por vendas baixas”, afirma Beraldo. “Os artistas hoje têm uma renda maior com shows do que com fonogramas. Portanto, os cachês aumentaram e os ingressos subiram. Com a pandemia, os custos de logística dispararam.”

O Primavera Sound, concorrente do Lollapalooza, paralisou as operações no Brasil após duas edições —no Sambódromo de Anhembi, em 2022, e no Autódromo de Interlagos, em 2023— e um anúncio de que ficaria no país por dez anos. Estes, aliás, foram os anos em que o mercado de música ao vivo viveu um pico de crescimento após o período pandêmico. Só o Lollapalooza reuniu em torno de 300 mil pessoas —cerca de 100 mil por dia— em cada um daqueles anos, segundo os dados divulgados pela organização à época.

Em 2024, o festival afirmou ter recebido 240 mil pessoas nos três dias de shows, número mais alinhado com a realidade anterior à pandemia —em 2019, foram 246 mil. Para este ano, afirma o diretor artístico, a expectativa é de que menos gente vá ao festival, e na véspera ainda havia ingressos disponíveis para todos os dias do evento. Pode não lotar, ele acrescenta, mas vai estar cheio.

O show mais aguardado desta edição é o de Olivia Rodrigo, estrela adolescente da Disney que se tornou queridinha do pop rock, em sua primeira vez no Brasil —ela estreou com um show em Curitiba, na quarta-feira. Outro nome do pop, Shawn Mendes volta ao país depois de cantar no Rock in Rio, no ano passado. Justin Timberlake, em uma fase menos celebrada de sua carreira, conta com seu arsenal de hits dos anos 2000.

Os outros destaques deste ano são Alanis Morissette, Tool, Foster the People, Ca7riel & Paco Amoroso, Bush e Girl in Red, entre outros. O Fontaines D.C., nome do rock que era um dos mais aguardados, cancelou seu show e foi substituído pelo White Denim.

Para muitos frequentadores do Lollapalooza, esta é a escalação menos empolgante em anos. O festival sempre se destacou por ser vitrine de nomes quentes do cenário mundial e reunir artistas alternativos que, fora do evento, dificilmente tocariam no Brasil.

Nas últimas edições, o festival tem trazido em menor quantidade os músicos que estão no auge de sua carreira, em alta com a crítica e o público na época dos shows, casos de Billie Eilish, Rosalía e Lil Nas X em 2023. Também são mais raros os artistas que nunca cantaram no país ou que pelo menos não tocam há tempos.

“Está, sim, mais difícil”, diz Beraldo. “Nossa maior concorrência hoje são os shows solo desses artistas em estádios. Mas o Lollapalooza tem sido consistente em trazer essas atrações relevantes globalmente pela primeira vez. Ano passado tivemos SZA, que ganhou todos os prêmios, o primeiro show do Blink-182 no Brasil, e este ano temos Olivia Rodrigo.”

Os megashows em estádios são cada vez mais frequentes no Brasil. Cantores que antes só se apresentariam no país como atrações de festivais hoje preferem fazer suas turnês próprias. Coldplay, Bruno Mars, Taylor Swift e The Weeknd são exemplos recentes.

O dólar em alta, além de atrapalhar a contratação de nomes de peso, é “o maior componente de aumento de preço do ingresso acima da inflação”, afirma Beraldo. “Nosso grande custo é em dólar. O cachê que se paga a Olivia Rodrigo aqui é o mesmo que se paga na Austrália ou no Japão —países de moeda forte. Os ingressos subiram muito no mundo todo, e no Brasil ainda mais, devido à desvalorização do real.”

Beraldo também vê uma percepção distorcida no preço dos ingressos. Só 2% das entradas, diz, saem pelo valor cheio. O resto é meia-entrada ou meia social, com desconto de 45% em troca da doação de R$ 20 revertidos à caridade.

Assim, o Lollapalooza contrata artistas que podem até ser desconhecidos do público geral, mas tocam aos milhões no TikTok, como Nessa Barrett, Tate McRae, Benson Boone e Teddy Swims.

Marcelo Beraldo, no entanto, diz que números não são medida de sucesso. “Claro que a gente olha os dados de streaming e redes, mas isso não significa que o cara é um bom vendedor de ingressos”, ele afirma. “Qualquer artista do funk brasileiro tem mais audiência que os Rolling Stones, só que nenhum deles vai vender ingressos de R$ 500, enquanto um show dos Stones vai lotar em qualquer lugar do mundo. Não é só olhar os dados. Tem que interpretá-los.”

Para além dos músicos que vão subir ao palco —a escalação ainda tem nomes nacionais como Jão, Marina Lima e Sepultura—, o diretor artístico vê outros diferenciais no Lollapalooza. Segundo ele, o evento se destaca por proporcionar uma experiência mais completa de festival, com muitos palcos e dezenas de atrações espalhadas, e não apenas uma reunião de shows no mesmo espaço.

É uma abordagem diferente dos concorrentes The Town e Rock in Rio, feitos pela mesma empresa, a Rock World, com orçamento muito maior, segundo Beraldo. Esses eventos se apoiam mais nos headliners —os principais, anunciados a conta-gotas— e aglutinam atrações parecidas. O festival carioca tem o “dia do rock” ou “dia do trap”, enquanto o paulista fez uma data toda dedicada ao punk.

“No Lollapalooza, você vai para ver um pouco de tudo”, diz Beraldo. “Uma hora você está num palco, outra hora em outro. Tanto que a maior parte dos ingressos vendidos são do ‘pass’, que dá direito aos três dias. O Rock in Rio não vende ‘pass’. Eles só vendem ingressos para os dias separados.”

O Lollapalooza também está à frente da concorrência no aproveitamento do território —arquitetura aperfeiçoada desde 2014, quando passou a ocupar o autódromo. Ainda que as chuvas sejam um problema recorrente, os palcos são bem distribuídos e usa os morrinhos naturais do local para proporcionar boa visão ao público.

Se, por um lado, é justo dizer que o Lollapalooza já viveu dias melhores, em uma conjuntura mais favorável, também é certo que o festival se consolidou no imaginário dos fãs de música. É uma solidez que permite à produção vislumbrar um futuro mais tranquilo depois da tempestade. O diretor afirma que, após o pico de alta nos cachês, os preços estão “se acomodando e voltando ao nível normal”.

Ele afirma que está há seis meses trabalhando na edição de 2026, para a qual já tem dois nomes fechados —um de rap, e outro na seara de pop e rock, ambos com sucesso nos últimos anos.

“A gente começa a trabalhar dois anos antes do festival. Fechamos com Olivia Rodrigo antes de ela bombar como está agora. É arriscado. Às vezes o artista está bem agora, mas quem sabe como vai ser daqui um ano?”, ele diz. “Mas acho que a experiência ajuda nesse sentido. O festival vai amadurecendo e aprendendo com seus erros e acertos.”



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