Figura polêmica do governo Milei intensifica ação contra manifestações – 29/03/2025 – Sylvia Colombo


Os primeiros sinais de descontentamento e inquietação social começaram a surgir na Argentina do presidente de ultradireita Javier Milei. Eles partem do setor da sociedade que mais está sofrendo com os ajustes promovidos no último ano, os aposentados, que vêm perdendo cada vez mais poder de compra num país em que remédios e alimentos, apesar da inflação mais baixa, continuam muito caros.

Tradicionalmente, os protestos dos aposentados costumam ocorrer nas quartas-feiras, na praça do Congresso. Nas últimas semanas, outros setores da sociedade vêm se juntando a essas manifestações, incluindo até mesmo torcidas organizadas de futebol.

No último dia 12, houve uma repressão intensa com pelo menos um ferido grave, o fotógrafo Pablo Grillo. Oposição e organizações de direitos humanos acusaram a polícia de abuso e descumprimento do protocolo no modo como atuou. Já na semana seguinte, a manifestação foi mais contida, porém, ao custo de uma operação de cerco ao Congresso e de intensa propaganda de tom ameaçador por parte do governo.

No centro da repressão e da política de contenção de manifestações, está uma das ministras mais importantes do governo, Patricia Bullrich. Ela não integra o partido de Milei, mas sim o de Mauricio Macri, aliado político do governo.

Se essas manifestações continuarem ocorrendo, com novos sinais de descontentamento, Bullrich ficará ainda mais no centro do poder. Ela tentou ser presidente, porém foi derrotada já no primeiro turno das eleições.

Seu eleitor clássico é o argentino de classe média que foi criando, desde 2001, auge do “estallido social”, uma verdadeira ojeriza aos piquetes, manifestações de distintos sindicatos ou organizações sociais que jamais deixaram de ocorrer. Bullrich tornou-se a mulher antipiquetes. Primeiro, sob o governo Macri. Agora, numa versão turbinada, com Milei como chefe.

Durante sua própria candidatura à Presidência, fez de tudo para capitalizar a pauta da segurança. Chegou a apresentar a maquete de um centro de detenção inspirado nos megapresídios de Nayib Bukele, em El Salvador, que pretendia batizar de Cristina Fernández de Kirchner, numa provocação calculada. Mas engana-se quem pensa que Bullrich é um personagem unidimensional.

Na Argentina, poucos representam tão bem as reviravoltas e paradoxos da política nacional. De militante da Juventude Peronista nos anos 1970 —quando o país viveu uma ditadura, e o Estado reprimia qualquer expressão social— passou a ser a atual gestora de um sistema repressivo que reprime com gás e balas de borracha os mesmos setores que um dia dizia defender.

Ministra do Trabalho no governo de La Rúa, defensora do desmonte de direitos sociais, e, mais tarde, a “dama de ferro” de Macri, Bullrich encarnou um projeto de militarização da política de segurança.

Hoje, sob Milei, aprofunda esse caminho. Seu novo protocolo antipiquetes transforma o protesto em crime e o manifestante em inimigo interno. Logo na primeira marcha contra a chamada Lei Ônibus, com aposentados e estudantes nas ruas, a repressão foi imediata.

A virada de Bullrich precisa ser lembrada, e tanto sua figura quanto a possível intensificação dos protestos merecem atenção num ano crucial, de eleições legislativas, para definir o restante da gestão Milei.


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