Derrite busca exemplo abominável para combater o crime – 29/03/2025 – Opinião


Na incômoda situação de lidar com uma sensação popular de desamparo a despeito de números favoráveis, o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, afirmou que o Brasil deveria aprender a combater a criminalidade com —pasme— El Salvador.

Em outras palavras, Derrite julga apropriado buscar inspiração em Nayib Bukele, um Hugo Chávez da direita, um populista autoritário que avilta a democracia e governa sob regime de exceção, com sacrifício dos direitos humanos e das liberdades civis.

Alardeia-se que, debaixo do porrete de Bukele, os índices de homicídio em El Salvador despencaram de 38 casos por 100 mil habitantes em 2019 para 1,9 em 2024. Redução que, nem sempre se diz, ocorreu à custa de desaparecimentos, encarceramento em massa e julgamentos sumários de mais de 75 mil pessoas, entre as quais mais de 1.200 crianças.

No país exemplar de Derrite, 1,7% dos 6 milhões de habitantes estão atrás das grades; no Brasil, a taxa é de 0,3%, e elevá-la a níveis de El Salvador significaria prender cerca de 4 milhões de brasileiros. É essa cifra abominável que o secretário quer ver por aqui?

Cotado para voos políticos em 2026, o capitão da reserva da Polícia Militar acena, com seu discurso medieval, ao núcleo do bolsonarismo, em tese favorável ao endurecimento das leis —desde que não se apliquem a eles próprios.

Derrite, por exemplo, reuniu um número exorbitante de assessores policiais militares, num sinal claro de aparelhamento da secretaria; ademais, enviou emendas parlamentares para sua própria pasta, a fim de reforçar ações em seu reduto eleitoral.

Ele gostaria de ser julgado de forma sumária pela falta de transparência e possível uso de recursos públicos para fins pessoais? Ou prefere ter garantias processuais para se explicar à luz de regras claras, caso seja necessário?

Por incoerente que seja, esse tipo de bravata linha-dura cai nas graças de parcela da população e interessa a Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador que oscila entre os gestos moderados, de um lado, e os sinais bolsonaristas, de outro —sobretudo na área da segurança.

Seu secretário, afinal, teve o desplante de não reconhecer excessos nas mais de cem mortes cometidas por policiais na Baixada Santista, muitas das quais com evidências de abuso.

O que Derrite parece não entender é que os direitos humanos não são mero discurso. Eles representam um avanço civilizatório para proteger cidadãos contra abusos de quem quer que seja, inclusive da truculência do Estado.

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