Bella Campos: Estou dando minha cara a tapa em ‘Vale Tudo’ – 29/03/2025 – Mônica Bergamo


“Vale Tudo” só estreia nesta segunda (31), mas Bella Campos, 27, diz já sentir na própria vida os efeitos transformadores de interpretar a vilã Maria de Fátima no remake da novela que é considerada por muitos a melhor produção já feita na teledramaturgia brasileira. “Sou uma pessoa antes e depois de Maria de Fátima.”

A rotina tem sido desafiadora. São cerca de 11 horas de gravação diárias, fora os compromissos com eventos de divulgação e outros. “Mas está sendo tão divertido que o cansaço passa batido”, garante ela. Bella conversou com a coluna na noite da última quarta-feira (26) por videochamada. A entrevista quase não ocorreu. Em outras três oportunidades, uma na própria quarta pela manhã, os encontros online foram desmarcados porque a atriz estava envolvida com as filmagens e outras obrigações.

“Vale Tudo” é a terceira novela de Bella. Antes, ela fez dois grandes sucessos na Globo. Estreou como Muda no remake de “Pantanal” (2022), e depois emendou com “Vai na Fé” (2023). Ao ser questionada sobre a sua carreira em ascensão, a atriz se emociona. “Na verdade, eu nunca imaginei que isso seria possível para mim, pelo ambiente onde eu cresci, pelas oportunidades que até então tinha acesso.”

“A atuação, na verdade, foi um movimento inesperado na minha vida, e eu tenho tenho muita gratidão por ter sido puxada para esse caminho da arte”, completa. A faísca artística acendeu quando ela tinha por volta dos 18 anos e foi trabalhar em uma cafeteria dentro de um teatro de Florianópolis. Nascida em Cuiabá, Bella tinha se mudado com a mãe e a irmã mais nova para a capital catarinense anos antes. De origem humilde, ela conta que conseguiu o emprego porque não tinha dinheiro para comprar o livro exigido para o vestibular de psicologia, faculdade que pretendia cursar.

Ali, ouvia de clientes e do gerente do local que deveria trabalhar no segmento audiovisual. “Foi um período muito divertido da minha vida. Tive a oportunidade de assistir peças, de conhecer artistas, de ver as exposições que rolavam”, relembra. “Só que eu não tinha nem tempo nem grana para acessar as escolas de teatro e tudo mais. Para falar a verdade, eu nem sabia muito bem por onde começar.”

Foi o gerente da cafeteria que a indicou para uma agência que um amigo dele que era modelo trabalhava. Inicialmente, porém, os seus 1,62 metro de altura foram um empecilho. “É até uma coisa interessante que na trama da Maria de Fátima, quando ela vai fazer os testes para ser modelo, uma coisa que breca é a altura dela, as pessoas falando que ela não serve para aquele ambiente.”

Mas Bella conseguiu alguns trabalhos e passou no primeiro teste que fez para um comercial de TV, de uma noiva que sonhava com o casamento. “Achei aquilo incrível porque tinha figurino, tinha uma história, tinha uma emoção que não era minha, mas que eu estava resgatando coisas em mim para trazer para aquela personagem. Achei mágico esse movimento, as câmeras e o resultado”, diz.

O próximo passo foi ir para São Paulo, onde conseguiu juntar dinheiro e fazer o curso profissionalizante na Academia Internacional de Cinema. Depois, ela fez uma série de workshops que funcionavam como testes para “Malhação”. Ao final, foi escolhida como uma das protagonistas da nova temporada da série adolescente da Globo. Às vésperas do início das gravações, em 2020, veio a pandemia e o projeto acabou cancelado —a emissora decidiu pôr fim em definitivo ao programa, que era um celeiro de atores, no ano seguinte.

Apesar de ter vivido um luto pelo ocorrido, Bella diz ter procurado encarar a situação pelo lado de que ganhou experiência. “No final desse mesmo ano, começaram os testes para ‘Pantantal’, e eu lembro de ter pedido para fazer porque era uma novela sobre o lugar onde eu nasci, das minhas origens.” Para “Vale Tudo”, a atriz também afirma que pediu para fazer testes depois de ver circular na mídia a informação de que estava cotada para o papel de Maria de Fátima. “Quando começou a sair essa notícia, pensei: ‘Calma aí, eu quero fazer’”, recorda.

Bella nasceu em 1998, dez anos depois de a trama assinada por Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères ter ido ao ar. Embora até então nunca tivesse assistido a novela, a atriz afirma que sempre soube da “grandiosidade” e da “preciosidade da obra”. “A Odete Roitman sempre esteve na minha cabeça e no vocabulário da minha família. Desde muito pequena, na minha família sempre existiu o meme ‘quem matou Odete Roitman?’”, afirma.

Assim como em “Pantanal”, ela diz ter feito questão de assistir a versão original de “Vale Tudo”, apesar de não ter conseguido ver toda a produção. “É um clássico, não tem como não olhar.” Diz também que está muito ansiosa com um possível encontro com a atriz Gloria Pires, intérprete de Maria de Fátima na trama de 1988. “Espero que a gente consiga se ver em breve, porque realmente o trabalho da Gloria é maravilhoso e inspirador.”

Questionada sobre as críticas que a escolha do seu nome para o papel de Maria de Fátima tem suscitado nas redes sociais mesmo antes do início da novela, Bella afirma que a sua trajetória toda é marcada por ocupar lugares que “a priori eram inéditos para meninas como eu”. “Esse desafio me anima, me deixa com vontade de ir lá e fazer porque é para além do resultado. É um ato político ocupar um lugar em que [você] é desacreditado, que não foi desenhado para ser desta forma.”

Para a artista, não se trata de provar nada para ninguém, mas de pensar na sua própria história e na sua realização. “Aceitar um desafio como esse é colocar a minha cara a tapa.”

“É falar: ‘Eu vou estar aqui, vou fazer isso, vou acreditar no meu potencial’. Eu fiz esse teste, fui acreditada para ocupar esse espaço por profissionais qualificados e vou ocupar esse espaço, que não foi me dado de graça. Estudei, me preparei, me dediquei para isso”, acrescenta.

Bella diz que interpretar Maria de Fátima já tem provocado “transformações gigantescas” em sua vida. Ela afirma que a personagem é um exemplo de obstinação e de uma pessoa corajosa, que consegue bancar o que deseja. “Porque sustentar a sua decisão é muito mais importante do que a decisão em si. Isso é uma coisa que estou aprendendo com ela.”

A atriz diz esperar que a sua Maria de Fátima seja amada e odiada pelo público — talvez, um pouco mais odiada. “O que ela fala pra mãe dela, não tem como. De onde eu vim, da criação que eu tenho, as coisas que ela fala nem existem.”

Bella diz ficar muito feliz pela atualização que a autora Manuela Dias fez para o remake da história ao inserir personagens negros, a exemplo da mocinha, Raquel, vivida agora por Taís Araujo (Regina Duarte interpretou o papel em 1988), além da própria Maria de Fátima. “É importante porque isso pode ser um espelho realmente do que é o Brasil. Até bem pouco tempo atrás, a gente tinha papéis extremamente estereotipados [para atores negros].”

“Hoje, quando a gente apresenta personagens opostos sendo negros, podemos falar da complexidade do que somos, de que podemos ter opiniões adversas e, ainda assim, fazer parte da mesma comunidade. E isso é possível graças à própria Tais e a outros atores e atrizes negros, que abriram portas para que eu possa fazer essa vilã patricinha, incoerente, imoral, preta, e também para termos a mocinha da novela preta.”

Nessa atualização, porém, jornalistas têm questionado como o remake explicará um dos pontos centrais da história, que é quando Odete Roitman se alia a Maria de Fátima para que o seu filho Afonso (Humberto Carrão) não se case com Solange (Alice Wegmann). A questão que se coloca é: Sendo uma mulher elitista e preconceituosa, Odete toparia firmar um pacto com uma mulher negra?

Para Bella, só pelo fato de a novela levantar esse debate “já há um ganho”. “E é só a gente pensar como se dá o racismo. [Ele acontece] na relação de poder. Mas a Odete é uma pessoa que vai se aliar a qualquer um, desde que isso seja favorável para ela”, opina.

Para o futuro, a atriz diz ter muitos desejos, como fazer algo no teatro e outros projetos no cinema —ela já gravou o filme “Cinco Tipos de Medo”, que deve estrear ainda neste ano. “Eu me permito sonhar alto porque vejo que tem funcionado sonhar. Então, quem sabe posso desenvolver algum projeto internacional também”, diz.

Antes de ser aprovada como Maria de Fátima, Bella vinha fazendo um intercâmbio na Califórnia, nos Estados Unidos, para aprimorar o seu inglês. “Sobretudo quero continuar sendo muito feliz com a minha família nas coisas simples da vida, que também são muito importantes e valiosas. Se eu conquistar todos esses sonhos [profissionais] e não tiver isso, para mim, não vai valer a pena.”



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