Bets e apostas causaram perdas de R$ 103 bilhões ao varejo

O varejo brasileiro deixou de faturar R$ 103 bilhões ao longo de 2024 devido ao redirecionamento de recursos das famílias para as plataformas de apostas esportivas e cassinos online, conhecidas como “bets”. Essa é a conclusão do estudo divulgado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).

O levantamento, intitulado O Panorama das Bets, baseou-se em dados do Banco Central que apontam que, em 2024, os brasileiros destinaram cerca de R$ 240 bilhões a essas plataformas. Segundo a CNC, as apostas online não apenas causam endividamento e vício entre os apostadores, mas também geram impactos socioeconômicos profundos para toda a sociedade.

A atuação das bets no Brasil foi autorizada pela Lei Federal 13.756, sancionada em 2018. Desde então, essas plataformas expandiram significativamente e investiram massivamente em publicidade, incluindo o patrocínio de clubes de futebol. 

Esse estudo da CNC destacou uma preocupação particular com os cassinos online, como o popular Jogo do Tigrinho, presentes na maioria das bets. Economistas estimam que 80% dos pagamentos feitos pelos usuários dessas plataformas sejam destinados a modalidades de cassino online, enquanto as apostas esportivas representam uma parcela menor.

Economistas da CNC afirmam que a Lei Federal 13.756 ainda necessita de regulação pelo Ministério da Fazenda. Segundo eles, um “limbo regulatório” permitiu que sites de apostas esportivas incorporassem cassinos online de maneira descontrolada. 

“A ausência de regulamentação também facilitou a lavagem de dinheiro e outras atividades ilícitas, prejudicando a economia formal. O crescimento dos cassinos online tem desviado recursos que poderiam ser investidos em setores produtivos, como o varejo, impactando toda a cadeia produtiva”, aponta o estudo.

Estima-se que, em 2024, cerca de 1,8 milhão de brasileiros tenham entrado em situação de inadimplência devido às apostas online. A CNC destaca que muitas pessoas, especialmente de menor renda, deixam de honrar seus compromissos financeiros para realizar apostas. 

Entre novembro de 2023 e novembro de 2024, o percentual de famílias com contas em atraso aumentou de 26% para 29% no grupo com renda entre 3 e 5 salários mínimos. No grupo com renda entre 5 e 10 salários mínimos, por outro lado, a inadimplência caiu 2,6 pontos percentuais, encerrando o período em 22%.

“A inadimplência elevada pode levar à redução do consumo, desaceleração econômica, aumento da taxa de juros e instabilidade financeira”, alerta a CNC.

Impacto nas famílias de baixa renda

As apostas realizadas por benefíciários do Bolsa Família tornaram-se foco de debate público em setembro de 2024, após uma nota técnica do Banco Central revelar que, em agosto, esses beneficiários gastaram R$ 3 bilhões em bets. Os valores referem-se a transferências via Pix para as plataformas.

Na época, o governo federal anunciou medidas para aumentar o controle sobre as bets, incluindo um pente-fino nos sites de apostas e o bloqueio daqueles sem autorização para operar, conforme a Lei Federal 13.756. Uma lista divulgada recentemente pelo governo identifica 66 empresas autorizadas, sendo 14 com licença definitiva e 52 com liberação provisória, sujeitas a ajustes.

O Supremo Tribunal Federal (STF) também interveio em novembro, determinando que o governo federal adotasse medidas para impedir que recursos do Bolsa Família sejam utilizados em apostas online. A decisão considerou que o programa, criado em 2003, tem como objetivo garantir alimentação, saúde e educação, assegurando a cidadania e dignidade das famílias atendidas. 

Propostas

No estudo divulgado hoje, a CNC defende a adoção de medidas regulatórias adicionais para prevenir e reduzir os impactos gerados na sociedade a partir da operação das bets. Entre elas, está o estabelecimento de limites de apostas, a criação de programas de prevenção e tratamento para viciados, a realização de campanhas de conscientização pública sobre os riscos associados e a exclusão das modalidades altamente propícias a fraudes e à clandestinidade.

A entidade defende, ainda, que os impostos são cruciais para a organização e controle da atividade e que a regulação favorece a arrecadação de tributos, que podem ser direcionados para financiar programas sociais, de saúde e de outras áreas que contribuam para compensar os danos causados pelo vício.

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