Projeto contra prostituição nas ruas preocupa mulheres – 14/03/2025 – Cotidiano


Stella, 46, é o arrimo da família. Paga o aluguel de um apartamento de 27 metros quadrados e compra alimentos para manter a mãe, dois filhos e um sobrinho. Todo mês, ela precisa levantar cerca de R$ 2.000 para isso. Nem sempre é possível. Cobrando R$ 30 por cliente, a prostituta precisa realizar 66 programas para cumprir sua meta.

Essa é a realidade de outras tantas profissionais do sexo que atendem na região da Luz, no centro de São Paulo. Elas, porém, não se vitimizam. Apenas temem perder o trabalho.

O deputado federal Kim Kataguiri (União-SP) apresentou um projeto de lei na Câmara dos Deputados, na última sexta-feira (7), para proibir a presença de prostitutas em vias públicas. Ele quer incluir a profissão, reconhecida legalmente, na Lei das Contravenções Penais.

Sua proposta prevê pena de prisão de 15 dias a três meses ou de 50 a 100 dias, além de multa, para quem for flagrado oferecendo serviços sexuais em ruas e avenidas do Brasil.

O texto afirma que a prostituição em vias públicas interfere diretamente no direito de locomoção das outras pessoas e acontece “muitas vezes em frente a residências familiares”.

A apresentação do projeto repercute entre o público-alvo dele.

Preocupadas, as profissionais receiam ter que se render ao trabalho em plataformas de acompanhantes ou serem cooptadas por prostíbulos. Nessa situação, sim, elas estariam envolvidas num crime, o rufianismo —quando outras pessoas, caso dos cafetões e cafetinas, tiram proveito financeiro da atividade.

“Parece que é isso o que o deputado quer, entregar essas mulheres para terceiros se aproveitarem delas”, opina Thamiris Suellen, coordenadora da Mulheres da Luz, coletivo que visa promover a cidadania e a garantia de direitos humanos das trabalhadoras do sexo naquela região.

Thamiris diz que as prostitutas caminhando pelo bairro, especialmente no parque e na estação, são pessoas negras e pobres que encontram ali seu único meio de sobreviver. Segundo ela, há até idosas com 70 anos trabalhando para sustentar seus netos. “Se você proíbe uma pessoa dessa de ficar na calçada, para onde ela vai?”, questiona. “Há clientes para ela fora das ruas?”

A Mulheres da Luz se mobiliza para cobrar do Estado, e do próprio deputado Kataguiri, políticas públicas que não persigam, mas apoiem profissionais do sexo e entendam sua situação de vulnerabilidade.

Outras entidades apoiam a demanda, especialmente a casa de acolhimento LGBT+ Neon Cunha. Muitas das travestis e mulheres trans lá vivendo já se prostituíram ou ainda exercem a profissão.

“Tirar os direitos dessas pessoas, já excluídas da sociedade, de ganhar o pão é desonesto e desumano”, diz Paulo Araújo, articulador da entidade.

Outra questão que incomoda prostitutas e organizações é a afirmação do deputado de que os atendimentos ocorrem em áreas residenciais. Todas negam isso, afirmando haver um confinamento de acompanhantes em poucas áreas da cidade e que sua atividade é discreta e inofensiva para a população.

Tais locais de oferecimento de serviços sexuais em São Paulo, mapeiam as entidades, estão concentradas em poucos locais e nenhum numa zona cheia de moradias.

Há seis pontos principais: a avenida Afonso de Sampaio e Souza, na zona leste, ao lado do parque do Carmo; a avenida Santa Eulália, na zona norte; a avenida Indianópolis, na zona sul; a avenida Waldemar Ferreira, próxima à USP (Universidade de São Paulo), na zona oeste, e a avenida Lineu de Paula Machado, em frente ao Jóquei, na mesma região. Além da Luz.

O projeto ainda precisa passar por comissões e ser aprovado para seguir em tramitação na Casa. Não há prazo para esse processo.



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