Fusão entre Gol e Azul pode afetar aeroportos, diz Aena – 22/03/2025 – Mercado


Uma eventual fusão entre Azul e Gol agravaria a concentração no setor aéreo brasileiro e poderia elevar o preço da passagem, prejudicando operações em aeroportos menores. É o que diz à Folha Santiago Yus, diretor-presidente da Aena Brasil, companhia espanhola responsável por administrar o terminal de Congonhas, na zona sul da capital paulista.

Em janeiro, a Abra, dona da Gol, e a Azul assinaram um memorando de entendimento que, se cumprido, levará à fusão das empresas aéreas após a aprovação pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e pela Anac (Agência Nacional da Aviação Civil).

“A gente tem aeroportos lá na ponta, no Pará, em Ponta Porã (MS)… É difícil manter algumas operações. Se essa resultante [uma eventual fusão entre Gol e Azul] fizer com que alguma estratégia mude, poderíamos ter alguma dificuldade a mais. “, diz Yus.

Entre os 17 aeroportos brasileiros dos quais a Aena é concessionária, Congonhas é o mais importante deles. O terminal passará por um ciclo de investimento e expansão nos próximos anos. Segundo a empresa, o aeroporto paulistano passará dos 23 milhões de passageiros, em 2024, para cerca de 30 milhões por ano a partir de 2030.

Uma das recentes decisões tomadas pela concessionária foi reduzir as operações da aviação executiva e proibir a presença de jatinhos na pista principal de Congonhas, medida que impulsionará a pontualidade e a receita do terminal, segundo Yus.

“A aviação executiva faz um transporte de um, dois, três, oito, dez pessoas. Um avião comercial, no mínimo, são 120, 130 pessoas. É um uso mais intensivo de pessoas que podem usufruir de um aeroporto como Congonhas, que é bem demandado.”

Segundo o executivo, a escalada na Selic, a taxa básica de juros, aumenta o custo de financiamento. Mas o cenário macroeconômico não preocupa e não afetará a execução das obras do aeroporto, diz. “Temos nossas margens dentro do negócio.”

A meta em Congonhas é aumentar o número de passageiros para 30 milhões por ano a partir de 2030. O que pretendem fazer para elevar o fluxo de pessoas sem comprometer a segurança do aeroporto, que já é bem movimentado?

Depois da chamada fase B, que é a ampliação de toda a infraestrutura, a gente tem que cumprir o manual de desenho do aeroporto, da Anac. Nesse desenho que a gente faz de infraestrutura, poderíamos chegar a ter na faixa de 30 milhões de passageiros [por ano] até o final da concessão.

Mas o que a gente está olhando é que hoje em dia todos os estacionamentos das aeronaves no aeroporto de Congonhas têm algumas restrições. Por exemplo, para o A321 [da Airbus], praticamente não existem posições. Para o 737 MAX [da Boeing] tem algumas posições nas pontas que não são compatíveis com esse modelo de aeronave. O ponto é que, no novo desenho de infraestrutura, todas as posições de estacionamento que a gente vai ter, que passarão de 30 para 37, vão ser aptas para o A321, que é uma aeronave maior. Agora um Embraer faz 150 passageiros, um 737 faz 180 passageiros, o A321 pode chegar a [mais de] 200 passageiros.

Seria o mesmo número de operações, mas com uma capacidade maior por cada aeronave. Isso nos levaria a ter uma capacidade de processo de passageiros maior. Do ponto de vista da circulação de aeronaves e do ponto de vista da segurança, não tem nenhum impacto. Pelo contrário, porque a infraestrutura vai estar muito melhor com todas as distâncias e vai permitir que a operação seja mais segura.

E em que momento o Congonhas vai começar a receber aviões maiores?

Estaremos prontos para receber todas as aeronaves no final da fase 1-B, em junho de 2028, que é a obrigação contratual.

No ano passado decidiram proibir jatinhos de usarem a pista principal. Por que tomaram essa decisão? A medida tem algum impacto na receita?

Primeiro, Congonhas teve uma ocorrência na pista principal. Simplesmente, um avião de aviação executiva furou um pneu, ficando parado na pista principal. Nesse caso, é necessário um procedimento de remoção da aeronave, o que gera um impacto direto significativo de atraso de avião circulando.

Depois houve outra situação: pela reordenação de todas as localizações atuais dos hangares de aviação executiva, alguns aviões que estavam do lado do terminal, da área comercial, para chegar na pista secundária, tinham que cruzar a pista principal. Tudo isso também acrescentava algum tempo de espera para o uso da pista principal.

E tem algumas aeronaves que demoram mais tempo para percorrer todo o táxi [taxiamento] e entrar e sair da pista. Tudo isso, no final do dia, tem um impacto final na pontualidade do aeroporto.

A gente quis reorganizar: passar toda aviação executiva para o lado da pista secundária, que é habilitada para a maioria dessas operações, e, na pista principal, irão operar a aviação comercial e aqueles aviões de grande porte da aviação executiva que não podem operar na pista secundária.

Além disso, a gente [Congonhas] tinha 44 operações por hora, com um mix de 36 comerciais e oito de aviação executiva. E a gente passou [em janeiro de 2025] para 44 por hora, com um mix de 36 comerciais e quatro de aviação executiva, respeitando uma margem de quatro operações por hora para fazer ajustes, caso sejam necessários, durante a obra. Quando a gente tiver toda a infraestrutura pronta, essas quatro [operações de margem] voltarão para aviação comercial, não voltarão para aviação executiva.

Por que priorizar a aviação comercial?

Tem duas razões, basicamente. Primeiro porque a gente quer que a infraestrutura seja usufruída pelo maior número de pessoas possível. A aviação executiva faz um transporte de uma, duas, três, oito, dez pessoas. Um avião comercial, no mínimo, são 120, 130 pessoas. É um uso mais intensivo de pessoas que podem usufruir de um aeroporto como Congonhas, que é bem demandado.

Também tem um impacto econômico. Por exemplo, a tarifa de pouso se dá em função do peso da aeronave. O peso da aeronave executiva não é igual ao da aeronave comercial. As tarifas de embarque multiplicamos por 120, 130 passageiros, mas o passageiro da aviação executiva só paga o pouso.

Sempre vamos deixar a aviação executiva dentro do aeroporto de Congonhas. A gente não está eliminando, queremos que continue, mas, do ponto de vista do uso intensivo da infraestrutura, é mais benéfico para a sociedade como um todo ter mais aviação comercial.

Como a Linha 17-Ouro, que passará por Congonhas, impacta o planejamento das obras do aeroporto?

Impacta positivamente. Afinal, ter mais modalidades de acesso ao aeroporto é muito bom. As previsões do estado, que foram publicamente comunicadas, é que estejam prontas tanto a estação como a operação para o ano de 2026. Dentro do nosso desenho está construído, inclusive, um túnel [que liga a estação ao terminal] que chega do lado onde está a saída de pedestres do estacionamento. Vai ser o primeiro aeroporto do Brasil onde o metrô vai estar realmente integrado ao próprio terminal do aeroporto [no terminal de Recife, também da Aena, o aeroporto é ligado à estação de metrô por uma passarela].

A gente espera que pelo menos de 10% a 15% dos usuários do aeroporto, sejam comunidades aeroportuárias, sejam passageiros, consigam usufruir do serviço do metrô, o que, de alguma forma, terá um impacto positivo na circulação de Uber, táxi, carro privado.

Além disso, aguardando por 2026, a gente já fez várias coisas. Antes de nossa chegada, não existia, por exemplo, um bolsão [para carros] de aplicativos. Atualmente, aproximadamente 60% dos carros que chegam no aeroporto são de aplicativos. E, antes, quando o Uber chegava lá para pegar um passageiro, não tinha bolsão. Passava, não conseguia pegar o passageiro, recirculava de novo. E tínhamos uma circulação permanente de Ubers sem passageiros.

A gente botou um bolsão e agora o passageiro faz a sua solicitação de Uber, o motorista sai do bolsão e pega o passageiro. Aquela área de desembarque, que antes era confusa, agora está bem organizada, inclusive com setores identificados para que o passageiro, quando faz o pedido de Uber, vá diretamente para o setor um, dois, três, quatro, cinco.

Também vamos construir uma praça no pavimento superior do edifício garagem para que toda essa circulação seja independente e não passe pela fachada do terminal. A previsão é que entreguemos até o fim de 2025.

Com a operação de aviões maiores, como lidarão com ruídos?

Todas as tecnologias, os fabricantes das aeronaves estão muito conscientizados, e eles estão cada vez mais eficientes.

Dentro da nossa política de incentivos para estimular atividades, a gente já vem implementando políticas de incentivos para o uso de aeronaves eficientes no aeroporto de Congonhas. Mas nenhuma coisa é isolada só do aeroporto. Quem gera ruído é a própria aeronave e também depende das rotas que são desenhadas pelo espaço aéreo e como isso pode impactar em um bairro. Isso já está fora do nosso escopo.

O Brasil vive hoje uma escalada da taxa básica de juros, a Selic. Isso impacta, de alguma forma, as obras de Congonhas e a atividade da Aena no país?

Sim, é verdade que, do ponto de vista macro, isso não ajuda. A gente também está vivenciando aquelas situações das companhias aéreas, e essa depreciação do real tem um impacto significativo sobre as empresas. Tudo é dolarizado: combustível, peça de avião, tudo é dólar.

Para infraestrutura, é óbvio que ter taxas de juros elevadas trazem custos paralelos em relação ao financiamento. A gente tem que ter muito cuidado e procurar o “timing” perfeito para que o modelo de negócio tenha o menor impacto possível.

Temos nossas margens dentro do negócio. Não estamos preocupados que possa ter um impacto sobre o processo das obras, e a gente cumprirá com as nossas obrigações de entrega. Nosso compromisso é esse.

Por falar na situação das companhias aéreas, como uma eventual fusão entre Gol e Azul poderia impactar o setor?

Ainda não existe uma solicitação formal de fusão, mesmo que publicamente esteja se falando abertamente. Obviamente, o órgão de competência, o Cade, terá que se posicionar.

Do ponto de vista mercadológico, um país como o Brasil, onde já existe uma alta concentração de empresas aéreas, ter uma menos, mesmo que a resultante seja uma companhia mais forte, poderá ter alguns impactos, como acréscimo nas passagens ou menor conectividade das decisões que possam ser tomadas por umas companhias e outras. Esse é um problema que a gente está monitorando.

A gente sabe que aproximadamente metade da população brasileira ainda não pegou um avião na sua vida. Democratizar a passagem aérea faz com que as pessoas tenham mais oportunidade de voar e também estimular essa demanda reprimida, o que é muito bom para o setor. Do ponto de vista da lógica do mercado, [a fusão entre Gol e Azul] é um pouco contrário.

No caso de uma eventual fusão, a passagem aérea poderia aumentar, como o sr. falou, e poderia ter um impacto numa concessionária de aeroporto por ter menos passageiros voando?

Conseguir operações para alguns aeroportos não é fácil, inclusive pela falta de avião neste momento, porque a indústria de fabricação das aeronaves está demorando com algumas entregas.

A gente tem aeroportos lá na ponta, no Pará, em Ponta Porã (MS)… É difícil manter algumas operações. Se essa resultante [uma eventual fusão entre Gol e Azul] fizer com que alguma estratégia mude, poderíamos ter alguma dificuldade a mais.

É óbvio que aeroportos como Congonhas sempre vão ser altamente demandados, mas também tanto Cade como Anac deveriam se posicionar. A Anac no ponto de vista da coordenação dos slots [jargão usado pelo setor para definir a movimentação de aviões na pista], porque seria uma concentração dentro de uma companhia com um número de slots muito além do que estava reconhecido.

Quais são os outros projetos da Aena no Brasil para além de Congonhas?

Nos aeroportos do Nordeste, a gente finalizou a entrega do primeiro ciclo de investimento em 2023. Nós, mesmo com todas as dificuldades de pandemia, cumprimos com nossos objetivos. Temos infraestruturas de um alto nível, infraestruturas do século 21.

Mesmo assim, a gente tem um desempenho de melhoria contínua a cada dia, implementando todas as nossas políticas de inovação tecnológica, também nossos projetos de ação climática e, enfim, trabalhando com as instituições privadas e públicas para trazer maior captação de conectividade para a região.

A gente entende que o Nordeste tem um potencial muito significativo. Passageiro que quer voar para fora do país normalmente tem que descer para São Paulo. Estamos trabalhando para trazer mais conectividade do potencial tanto turístico e doméstico quanto de possíveis conexões internacionais. Esses são nossos projetos, além da implementação da digitalização, que melhora a continuidade de todo o serviço e traz também um novo mix comercial.


RAIO-X | SANTIAGO YUS, 49

Natural de Zaragoza, na Espanha, é formado em ciências econômicas e empresariais pela Universidade de Zaragoza e em administração pela Nottingham Trent University, na Inglaterra. Iniciou a carreira na Aena em 2002, na área de planejamento e gestão, e desde 2019 ocupa o cargo de diretor-presidente da Aena Brasil

AEROPORTOS | AENA BRASIL

Aeroporto de Campina Grande (PB)

Aeroporto de Carajás – Parauapebas (PA)

Aeroporto de Juazeiro do Norte (CE)

Aeroporto de Marabá (PA)

Aeroporto de Montes Claros (MG)

Aeroporto de Congonhas (SP)

Aeroporto de Uberaba (MG)

Aeroporto de Uberlândia (MG)

Aeroporto de Altamira (PA)

Aeroporto de Aracaju – Santa Maria (SE)

Aeroporto de Campo Grande (MS)

Aeroporto de Corumbá (MS)

Aeroporto de João Pessoa (PA)

Aeroporto de Maceió (AL)

Aeroporto de Ponta Porã (MS)

Aeroporto de Santarém (PA)

Aeroporto do Recife Guararapes (PE)



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