Datafolha: Queda de aprovação de Lula não é por conjuntura – 15/02/2025 – Poder


A pesquisa Datafolha confirma uma tendência captada pela pesquisa Genial/Quaest de janeiro: uma queda significativa na popularidade do governo Lula. Em janeiro, a Genial/Quaest apontou que 37% dos brasileiros avaliavam negativamente o governo enquanto 31% avaliavam positivamente. Em fevereiro, o Datafolha registrou uma avaliação positiva de apenas 24%, com 41% de avaliação negativa. Embora alguns acreditem que essa queda é apenas um fenômeno conjuntural, está me parecendo estrutural.

A base que elegeu Lula em 2022 está frustrada. Mulheres, pessoas de baixa renda e o eleitorado do Nordeste expressam descontentamento crescente. Ao mesmo tempo, setores que compunham a frente ampla —liberais sociais, progressistas e empreendedores individuais— já demonstram insatisfação há meses. O governo parece encastelado, distante da realidade do país.

Historicamente, o voto econômico explicava a popularidade dos governantes. Benefícios sociais e crescimento da renda costumavam se traduzir em apoio eleitoral. Mas essa lógica está se desfazendo. Não há mais gratidão política automática. A sociedade mudou: o eleitor se tornou mais crítico e menos fiel. Muitos eleitores passaram a ver os programas sociais e os benefícios do governo como um direito básico, não como um favor que exige retribuição nas urnas.

Esse fenômeno é ainda mais evidente entre os evangélicos de baixa renda. A mudança nos valores da sociedade, impulsionada pelo crescimento do evangelicalismo, tem reduzido a eficácia do voto econômico. O discurso da meritocracia e da responsabilidade individual vem ganhando força, tornando o eleitor menos propenso a sentir gratidão política por benefícios estatais.

O “fim da gratidão” ainda não se manifestou de maneira tão intensa no Nordeste, apesar da queda na aprovação de Lula na região. Mas nas grandes cidades e no Sul e Sudeste essa transformação já ocorre há algum tempo. E esse não é um fenômeno exclusivo do Brasil. Governantes ao redor do mundo enfrentam dificuldades semelhantes para manter apoio popular ao longo do mandato.

A inflação e a corrosão do poder de compra também desempenham um papel importante. Embora o desemprego esteja baixo e o Bolsa Família tenha sido ampliado, os preços dos alimentos e bens essenciais subiram de forma acelerada. O eleitor percebe que sua renda não acompanha essa alta, gerando frustração. O governo não compreendeu completamente esse cenário. Não basta melhorar indicadores econômicos; é preciso entender a mudança na percepção das pessoas.

Além disso, o Brasil não elege uma agenda política clara desde 2014. De 1994 a 2010, os presidentes foram eleitos com pautas bem definidas, como o combate à inflação, a redução da pobreza e os investimentos em infraestrutura. Desde 2018, as eleições têm sido marcadas pela rejeição ao incumbente. Isso cria bases eleitorais heterogêneas e instáveis. Os grupos que se uniram para derrotar um adversário acabam se fragmentando rapidamente após a vitória.

Lula enfrentou esse dilema ao montar um governo que tenta agradar setores com demandas contraditórias. Mas liberais sociais, que querem um Estado menor, e trabalhadores da classe D e E, que exigem mais presença estatal, entram em conflito sobre as políticas do Ministério da Fazenda. Militantes de esquerda, defensores da regulação do mercado de trabalho, e empreendedores individuais, que preferem menos regras, também divergem. Essa falta de coesão desgasta a relação do governo com sua base e dificulta a governabilidade. Ao longo do tempo, isso se transforma em desaprovação.

Outro fator a considerar é a ascensão de temas “pós-materiais” no debate público. Desde 2018, questões culturais e identitárias passaram a ocupar o centro da política, substituindo discussões sobre o papel do Estado na economia. Isso intensifica a polarização e dificulta a construção de consensos.

O desafio para o governo não é apenas melhorar indicadores econômicos, mas reconstruir uma relação de confiança e credibilidade com o eleitorado. Isso exige reconhecer a mudança estrutural em curso e ajustar sua comunicação e sua agenda política para um novo tempo.



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